26.4.10

Sem emendas, PP questiona apoio a Dilma

Caio Junqueira, Valor Econômico, De Brasília, 16/04/2010

O PP emparedou nesta semana o único ministro que o partido tem na Esplanada, Márcio Fortes, das Cidades, para forçar o governo a liberar recursos das emendas parlamentares para os 40 deputados da legenda e de outros partidos da base governista, como PMDB, PTB e PR.

O partido estava em obstrução desde a semana passada, devido ao engessamento dos recursos das emendas que o governo vem promovendo neste início de ano. Diante da sinalização ontem de Fortes no sentido de tentar sensibilizar o ministro Paulo Bernardo (Planejamento) sobre as liberações, a obstrução foi suspensa.

Praticamente nenhum recurso das emendas parlamentares do Orçamento de 2010 foi pago a qualquer parlamentar. As liberações de recursos das emendas individuais têm sido feitas com base em restos a pagar dos Orçamentos de 2009, 2008 e 2007. Até o momento, os deputados do PT foram os maiores beneficiados. Receberam R$ 29,6 milhões, mais do que ganharam o PP e os três partidos que se colocaram "solidários" a ele no entrevero com o ministro: R$ 23,3 milhões.

A reclamação da bancada do PP sobre o imobilismo do ministro em face da situação já havia sido feita há alguns dias, mas a reação de Fortes agravou o cenário. Ele disse que não devia satisfações à bancada, apenas ao presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ao presidente da sigla, senador Francisco Dornelles (RJ). Havia queixas ainda sobre inaugurações de obras ligadas ao ministério. Os deputados reclamaram de três situações: de não serem convidados; quando convidados, de não serem citados; e dos convites a deputados de outros partidos.

A irritação era crescente, já que o Ministério das Cidades tem forte apelo popular e eleitoral, com grandes investimentos em áreas sensíveis à população, como saneamento, moradia e transporte. Revoltada, a bancada articulava a expulsão do ministro da Executiva, pois considerava-o mais um "secretário-executivo" da ex-ministra Dilma Rousseff, do que um ministro do partido.
Foi preciso então que Dornelles intermediasse o encontro de quarta-feira, onde, segundo o líder do PP na Câmara, João Pizzolatti (SC), "todas as arestas foram aparadas". "Resgatamos a sinergia dos interesses da bancada e do ministério. É legítimo os deputados estarem preocupados com obras em seus municípios", disse.

Os presentes ao encontro acertaram uma reunião para o fim da próxima semana. Nesse meio tempo, Fortes irá conversar com Paulo Bernardo a respeito das liberações. Procurado para falar sobre o assunto, o ministro das Cidades não respondeu ao pedido de entrevista do Valor.
O resultado do encontro poderá influenciar na decisão final do PP em apoiar formalmente Dilma nas eleições presidenciais. Isso porque o PP é fundamentalmente um partido congressual, sem cargos de maior expressão no Executivo.

Por essa razão, Estados que outrora sinalizavam apoio a Dilma começaram a demonstrar insatisfação com a preferência do Planejamento em liberar verbas para emendas individuais de parlamentares petistas. No plano nacional, Estados representativos como São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso, Distrito Federal, Minas Gerais, Tocantins e Rio Grande do Sul seguem indefinidos e ameaçam se afastar do governo.

A insistência do PT em lançar a senadora Ideli Salvatti (SC) ao governo de Santa Catarina também tem afastado o partido do PP, que quer apoio petista a Angela Amin. No Paraná, o PP trabalha pela candidatura do deputado federal Ricardo Barros. E em Roraima, o deputado Neudo Campos, que também lidera as pesquisas, tem encontrado dificuldades em conseguir que Dilma faça campanha para ele, por ele enfrentar denúncias de corrupção. (CJ)



Lista de aquinhoados tem aliados de Sarney, Renan, Geddel e Jader

Caio Junqueira, Valor Econômico, De Brasília,16/04/2010

Os deputados têm feito constantes reclamações às lideranças partidárias a respeito do baixo ritmo adotado pelo governo federal na liberação de recursos para as emendas parlamentares individuais. Alguns até articulam obstruções no plenário, a despeito de integrarem a base governista. Entretanto, para uma minoria, o ritmo adotado pelo governo nessas liberações tem sido acelerado.

Nesse grupo estão deputados ligados a fiéis apoiadores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como os senadores José Sarney (PMDB-AP), Renan Calheiros (PMDB-AL) e o ex-ministro das Relações Institucionais José Múcio, atualmente no Tribunal de Contas União (TCU); vinculados a próceres do PMDB, como ao ex-ministro Geddel Vieira Lima (BA) e ao deputado Jader Barbalho (PA), ambos pré-candidatos a governador em seus Estados; além de pré-candidatos ao Senado filiados a partidos mais próximos do Palácio do Planalto, como PT e PSB.

O deputado que mais recebeu verbas foi Fernando Melo (PT-AC), que pretende disputar uma vaga ao Senado por seu Estado. Apenas para ele, eleito com 18.385 votos, o governo liberou R$ 5,6 milhões. Na mesma condição de deputados pré-candidatos ao Senado aparecem outros nomes entre os que mais receberam verbas por enquanto.

Caso de Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), com R$ 936,6 mil; Paulo Rocha (PT-PA, citado no processo do mensalão), com R$ 783,9 mil; o ex-ministro da Previdência, José Pimentel (PT-CE), com R$ 525 mil; o presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO) de 2010, Waldemir Moka (PMDB-MT), com R$ 770 mil.

Aparece ainda Joseph Bandeira (PT-BA), suplente do deputado Walter Pinheiro (PT-BA), que reassumiu o cargo após uma passagem em secretaria do governador da Bahia, Jaques Wagner. Pinheiro é candidato ao Senado em seu Estado e os valores das emendas liberadas por Bandeira, R$ 3,2 milhões, estarão à sua disposição.

Da lista consta outro envolvido diretamente na pior crise da era Lula, o mensalão, em 2005. Trata-se de Pedro Henry (PP-MT), réu do caso no STF. Ele recebeu nos três primeiros meses deste ano R$ 1 milhão em emendas. No início do mês, licenciou-se do cargo para trabalhar exclusivamente no que é considerada uma difícil reeleição à Câmara. Seu nome esteve envolvido nesta semana em um vazamento de operações da Polícia Federal contra desvios de recursos públicos. Aos jornais, ele negou participação.

O levantamento foi feito com base em dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) atualizados até o dia 5 de abril e fornecido ao Valor pela assessoria técnica da liderança do Democratas da Câmara.

Apenas 42 parlamentares receberam no primeiro trimestre deste ano valores superiores a R$ 500 mil, referentes a emendas individuais apresentadas. Desses, há apenas dois ferrenhos opositores do governo. Raul Jungmann (PPS-PE), com R$ 650 mil; o presidente do DEM, Rodrigo Maia, o penúltimo da lista, com R$ 504,8 mil. Não há nenhum integrante do PSDB. Predominam no rol parlamentares do PT (15), seguidos por PMDB (6) e PSB (5). (CJ)







Internet vai municiar embate nas ruas e no vídeo entre candidatos
Caio Junqueira, Valor Econômico, de Brasília, 19/04/2010

Na primeira eleição presidencial brasileira após a bem sucedida campanha digital online que elegeu Barack Obama nos Estados Unidos, as coordenações das duas principais candidaturas já estruturaram seu núcleo de internet e decidiram o que importarão para a internet da experiência americana de dois anos atrás: uma extensa base de dados dos possíveis simpatizantes e muita informação em áudio e vídeo para municiá-los no embate político.

A diferença é que cada lado irá dar prioridade ao seu conteúdo na rede em acordo com a estratégia definida pelas cúpulas da campanha. O PT insistirá nas comparações entre os governos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB), ao passo que o PSDB tentará levar à rede o embate de biografias entre seu candidato, José Serra, e a petista Dilma Rousseff.

A expectativa de ambos é fazer com que a acirrada disputa que se verá na tevê, no rádio e nas ruas seja abastecida com informações fornecidas pelas campanhas na internet e amplificadas dentro e fora dela pela rede de apoiadores obtida nas redes sociais como Orkut, Facebook e Twitter. Os dados também serão divulgados pelos telefones celulares.

Essas deverão ser as principais influências da campanha americana, já que não há grandes perspectivas de doações financeiras online, por dois motivos: o baixo crédito dos políticos ante a opinião pública e a falta de tradição no país de que pessoas físicas colaborem com dinheiro para as candidaturas. A expectativa da presença da tecnologia da informação, porém, é bem alta. Tanto que, desde o ano passado, tucanos e petistas conversam com os dois principais nomes da campanha de Obama: Scott Goodstein, da empresa Revolution Messaging; e Ben Self, da Blue State Digital.

Goodstein foi " diretor online externo " de Obama e cuidou da estratégia nas redes sociais e nos celulares. Conseguiu 2 milhões de simpatizantes no Facebook, 1 milhão no MySpace e mais de 100 mil no Twitter. Criou ainda o " Obama Mobile " , com mensagens de texto, site móvel (WAP) e downloads de conteúdo pelo celular.

Já Self é especialista na gestão da campanha como um todo pela internet, com expertise na criação de ferramentas para identificar os apoiadores e chamá-los à campanha online e " offline " , além de sites específicos para esclarecer fatos negativos sobre os candidatos. Na campanha de Obama, ele criou um o " Fight the Smears " , algo como " combata as manchas" (www.fightthesmears.com) em que são colocadas as versões da campanha sobre o que consideram fatos manipulados pelo adversário.

O PSDB conversou com ambos mas foi o PT que decidiu contratá-los. Nos últimos 15 dias, os dois estiveram no Brasil para conhecer a equipe e começar a organizar a campanha. O contrato dos dois, na realidade, foi firmado com a agência Pepper Interativa, de Brasília, que contratou uma agência de comunicação para fornecer conteúdo e ainda assinou com Marcelo Branco, diretor-geral das três edições da Campus Party e ex-coordenador da Associação Software Livre.org (ASL), uma entidade cujo objetivo é ampliar a presença do software livre no país.

Sua aproximação com o governo deu-se a partir das discussões sobre o Plano Nacional de Banda Larga, onde atuou como um dos principais representantes da sociedade civil no debate com o governo. No início de fevereiro, teve encontro oficial com Lula para tratar do assunto.
Branco é atualmente o porta-voz da campanha online petista, sendo o responsável especificamente em multiplicar apoiadores e municiá-los com conteúdo político nas redes sociais.

" Vamos fornecer elementos de vídeo, áudio e texto, que possam mostrar as realizações do governo Lula, que tem mais de 70% de aprovação e muitas realizações ainda desconhecidas do grande público. Tudo servirá de munição para nossos apoiadores fazerem o debate político dentro e fora da internet " , afirmou.

Para ele, Dilma leva vantagem na disputa pela internet por duas razões. Primeiro pelo fato de ter em sua aliança os dois maiores partidos do Brasil em número de filiados: PT e PMDB, com 1,19 milhão e 1,96 milhão respectivamente. A oposição, somada, tem 2,4 milhões de filiados: 1,11 milhão do PSDB, 944,8 mil do DEM e 385,4 mil do PPS. O outro motivo apontado por ele é estarem na aliança com Dilma partidos ligados à esquerda histórica do país e com tradição de militância organizada, como PSB e PCdoB, além do próprio PT. " Isso tudo nos ajuda. É um patrimônio importante " , diz.

Otimista quanto à campanha digital, diz que de agora em diante a tendência é de que a internet seja o grande fórum de debate político nas eleições. " Redes sociais da web são uma grande praça pública. Serão as primeiras eleições com milhões debatendo política e postando suas opiniões. Não tenho dúvidas de que a internet ajuda a aprofundar a democracia brasileira a partir de milhões que não participariam da campanha se a net não existisse " , diz.

Os tucanos ainda estão fechando a equipe, mas a ideia é agregar pessoas que estão nas empresas que já atuam para o partido em serviços de marketing digital. São alguns deles: Cila Schumman, marqueteira que iniciou sua carreira no Paraná e hoje presta consultorias em São Paulo. Para o partido, ela elaborou o site " Gente que mente " , que elenca denúncias contra Dilma e Lula, expondo supostas mentiras dos dois seguidas pelo esclarecimento do fato.

Da agência paulistana Loops sairá o filho do ex-presidente e senador Fernando Collor (PTB-AL), Arnon de Mello, que deve ser responsável pela mobilização e planejamento estratégico da campanha digital. Também paulistana, mas com filiais em Brasília, Florianópolis e Seattle, a Talk Interactive cederá seu diretor-executivo, Moriael Paiva, que idealizou a campanha do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), à reeleição. Ele também foi um dos formuladores do tucano.org. Na primeira tentativa de Serra chegar ao Planalto, em 2002, trabalhou na campanha online, ainda incipiente à época. O partido está em negociação com mais duas pessoas, cujos nomes são mantidos em segredo.

À frente da equipe, Sérgio Caruso, atual coordenador de comunicação digital do PSDB e presidente da ONN Networking, uma das principais empresas de tecnologia digital de São Paulo, com clientes do porte de TIM, Telefônica e Nokia. Segundo ele, a campanha online deste ano deverá ter uma adequação do discurso de acordo com a realidade local do eleitor. " O grande desafio da campanha digital será o da relevância. Falar para as pessoas o que for do interesse local delas " , afirma. Além disso, diz que os bancos de dados serão úteis para chegar aos simpatizantes dos candidatos e dar-lhes munição para o embate político. No caso, com destaque para a biografia do candidato. " A vida do Serra tem conteúdo que não acaba mais, tem muita história para contar. É uma longa trajetória " , diz. Também devem ser postados dados positivos sobre a era FHC, um dos principais alvos dos petistas.

Nos bastidores, as duas campanhas online já estão contaminadas pela arquirrivalidade dos petistas e tucanos, com acusações recíprocas da chamada " campanha negativa " . Artifício muito utilizado no meio empresarial por meio do " troller " (internauta que provoca alguém com ataques pessoais e destrutivos) e do " fud " (técnica de gerar medo, incerteza e dúvida sobre a concorrência), o eleitor pode se preparar para acompanhá-las na campanha online deste ano. Sem, claro, o aval - ao menos oficial - das coordenações da campanha.

Em nível pessoal, as acusações são diretas aos envolvidos nas campanhas, sempre dentro do contexto digital. A equipe tucana é acusada de ser ligada às grandes empresas de comunicação digital, como a Microsoft, que a ONN de Sérgio Caruso tem em seu rol de clientes. Contra esse argumento avançam os tucanos, que apontam em Marcelo Branco uma trajetória incoerente. Aguerrido defensor do software livre e tradicional crítico da Microsoft, vai trabalhar ao lado de consultores tão americanos quanto a empresa de Bill Gates, que devem lhe oferecer um produto fechado, contrário aos princípios do software livre. Em seu Twitter, porém, ele já afirmou que todo o conteúdo digital da campanha terá por conceito o software livre.






DEM aposta em projeto tributário para garantir espaço na campanha
Caio Junqueira, Valor Econômico, de Brasília, 09/04/2010

Com risco de perder a indicação do vice na chapa de José Serra (PSDB) a presidente, o Democratas pretende garantir que o grupo que coordenará o programa de governo tucano discuta um projeto de lei, apresentado nesta semana, que prevê a plena restituição tributária aos contribuintes cuja renda familiar mensal seja de até um salário mínimo.
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Batizado de "Justiça Fiscal para o Pobre", mas apelidado dentro do partido como a "Bolsa Família do futuro", o projeto prevê o ressarcimento integral do valor de todos os tributos "diretos e indiretos, federais, estaduais, distritais e municipais, incidentes e pagos na aquisição de bens e serviços".

Algo semelhante ao que foi implementado por Serra em São Paulo e pelo ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda (sem partido, ex-DEM), com os programas Nota Fiscal Paulista e Nota Legal. Ambos devolvem parte do imposto estadual (ICMS) ao contribuinte como forma de estimulá-los a pedir documento fiscal dos estabelecimentos comerciais. O projeto também se inspira em experiências do Canadá, Cingapura e Estados Unidos.

A diferença é que, neste caso, a Fazenda Nacional é que ficaria responsável por fazer as restituições de todos os tributos cobrados dos cidadãos pobres. "Queremos que a reforma tributária seja discutida sob a ótica do contribuinte, e não do Estado", afirmou o líder do DEM na Câmara, Paulo Bornhausen (SC), autor do projeto.

A fórmula para as restituições considera o cruzamento de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2008 (PNAD) com dados da Fundação Getulio Vargas, pelo qual a estimativa é de que haja 30 milhões de pessoas vivendo em domicílios com renda familiar de até um salário mínimo.

A cada um deles seriam devolvidos cerca de R$ 43 por mês, resultado do cálculo de uma incidência de carga tributária da ordem de 53,9% sobre dois terços da renda per capita estimada em R$ 120. Assim, o impacto previsto anual seria de R$ 15,6 bilhões. O prazo de duração do programa seria de cinco anos. O Orçamento do Bolsa Família para este ano é de cerca de R$ 13 bilhões.

"O quadro político-tributário tornou-se ao mesmo tempo extremamente precário e grave e demandará paciente trabalho de reconstrução e redefinição. Não tenho dúvidas de que tarefa dessa dimensão deverá ser obra de alguns governos competentes e devotados ao reordenamento institucional do nosso país", afirmou Bornhausen, na apresentação do projeto na tribuna da Câmara.

A proposta parte de uma estratégia do partido de se vincular a causas que consolidem sua identificação com o combate à elevada carga tributária e ao aumento de impostos, adquirida quando liderou a derrubada do imposto sobre o cheque (CPMF), no Congresso, em 2007. Quer também o DEM associar-se a iniciativas que atinjam o cidadão de menor renda, uma necessidade mostrada à sigla pelo resultado das urnas em 2006, quando teve seu pior desempenho eleitoral desde a redemocratização. O motivo foi a ocupação de espaço pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos tradicionais redutos do antigo PFL no Nordeste do país, utilizando para tanto programas de transferência de renda, como o Bolsa Família.

O DEM contratou os serviços de consultoria do sociólogo Alberto Carlos Almeida, que, em suas pesquisas qualitativas pelo país (principalmente no Nordeste) em 2009, identificou a relação das camadas mais pobres da população com a bandeira da redução dos tributos. Ele concluiu que a maioria prefere um presidente que reduza os impostos dos alimentos a um que aumente o Bolsa Família; que a população aceita menos programas sociais se a contrapartida for a redução de impostos; e que 84% dos brasileiros reconhecem que pagam impostos quando compram mercadorias e serviços, ao passo que 81% dizem que aumentariam o consumo de alimentos se o imposto fosse diminuído.

"Nunca no Brasil ninguém falou de redução de impostos "para baixo", sempre para "os lados" - para políticos - ou "para cima" - para empresários. E numa campanha eleitoral também nunca se falou disso. Nossas pesquisas mostraram que o povo sabe que paga impostos e que gostaria de pagar menos", afirmou ontem ao Valor.



Aval a ajuda humanitária é alvo de disputa
Caio Junqueira, Valor Econômico, de Brasília, 07/04/2010

O Palácio do Planalto se mobilizou para tentar aprovar, na manhã de hoje, um projeto de lei que autoriza o governo a fazer doações de recursos financeiros e de bens móveis a outros países, com fins humanitários. Encaminhado ao Congresso no início do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o projeto foi aprovado por unanimidade nas comissões de Trabalho e de Relações Exteriores, mas começou a enfrentar obstáculos na Comissão de Finanças e, agora, na de Constituição e Justiça.

A principal crítica é que a oposição vê nele um "cheque em branco" para que Lula possa ser benevolente com outros países, com recursos do Brasil, inclusive com o objetivo de obter algum cargo em organizações internacionais a partir de 2011, sem passar pelo crivo do Congresso, que atualmente precisa autorizar as doações feitas por medida provisória.

Entre 2007 e 2009, o gasto anual com ajuda humanitária pelo Itamaraty foi de cerca de R$ 5 milhões por ano. Em 2010, o valor previsto para esse gasto é próximo a R$ 50 milhões. O Itamaraty justifica a diferença principalmente devido ao forte terremoto que atingiu o Haiti e matou milhares de pessoas.

O governo rebate afirmando que o debate sobre o projeto foi contaminado pelo ano eleitoral e que o interesse é desburocratizar um processo de ajuda humanitária cujo eventual atraso da apreciação legislativa pode acarretar perda de vidas nos países beneficiados. Além disso, a aprovação diminuiria a edição de MPs, crítica constante de parlamentares ao Executivo, já que elas trancam a pauta de votações.

Nas duas sessões em que o projeto foi avaliado neste ano na CCJ, os confrontos entre governistas e oposicionistas foram calorosos, com menções à Bolívia de Evo Morales, à Venezuela de Hugo Chávez, ao Irã de Ahamadinejahd e aos Estados Unidos da secretária de Estado, Hillary Clinton.

"Esse projeto talvez tenha o interesse de distribuir cesta básica para o país ser membro permanente da ONU ou o Lula ter um cargo lá. Não adianta porque Hillary Clinton disse que a política externa do Brasil é risível, tem poder de veto na ONU. Só estamos passando vexame com essa política externa", afirmou o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA).

À frente do governo na CCJ, José Genoino (PT-SP) rebateu. "Algumas cabeças da oposição estão preocupadas com o mundo porque já perderam a possibilidade de governar o Brasil. Essa ideologização lembra os anos 60 da Guerra Fria. Não vamos misturar ajuda humanitária com guerrilha, com armas", disse.

O projeto é o primeiro item da pauta de hoje da CCJ, mediante um acordo do DEM com o PT. Nas duas últimas sessões em que foi apreciado, o governo, em minoria, evitou sua apreciação em definitivo. Os dois partidos apresentaram cada qual um parecer. O da oposição foi feito DEM em março de 2009 e é pela inconstitucionalidade e injuridicidade. Alega, respectivamente, que a competência para resolver atos internacionais que acarretem encargos ao governo é do Congresso e que bens públicos não podem ser doados com caráter amplo e irrestrito.

Genoino apresentou um substitutivo no qual diz contemplar as críticas da oposição e as lacunas apresentadas pelo relator. "O que fiz no substitutivo foi explicitar o que estava implícito, para que a oposição não tenha motivos para reclamar. Isso não tem nada a ver com a ONU", diz. No texto, estabelece que apenas podem ser objeto de doação bens dominicais e que deve haver previsão orçamentária para as doações.

No início de 2010, o governo editou uma MP em que pede autorização para fazer doações ao Haiti e mais 11 países. A MP ainda não foi votada pelo plenário da Câmara, mas há quatro emendas da oposição questionando a necessidade dessas doações a outros países quando "o Brasil possui mais de 32% da população abaixo do nível de pobreza" e pedindo fiscalização da Controladoria-Geral da União nessas doações.





Ministério Público quer direito de atuar na vida política
Caio Junqueira, Valor Econômico, de Brasília, 06/04/2010

O Ministério Público começa a concentrar esforços para reconquistar o direito de participar de atividades político-partidárias e de concorrer, através de seus integrantes, a cargos eletivos. O MP pretende estancar as sucessivas derrotas que vem sofrendo no Congresso, onde viveu o seu auge em 1992, quando o então procurador de Justiça Ibsen Pinheiro presidiu a Câmara dos Deputados, liderando também o primeiro processo no país de impeachment de um presidente da República, Fernando Collor de Mello.

Apenas em março ocorreram duas dessas derrotas. A nova lei de ação civil pública, que ampliaria poderes do Ministério Público, caiu na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, sem nem sequer passar pelo plenário. E a "Lei Paulo Maluf", que pune integrantes do Ministério Público que agirem com má fé, intenção de promoção pessoal ou visando perseguição política, está prestes a ser votada na Câmara, mediante uma solicitação do PP partido do deputado autor.
Mais do que os critérios objetivos das duas derrotas, o que chama a atenção são suas circunstâncias: ocorreram sem que qualquer parlamentar, do governo ou da oposição, se insurgisse contra elas.

São justamente nessas circunstâncias adversas, cada vez mais frequentes no Congresso, que se fundamenta o anseio do MP em retomar o direito de participar de atividade político-partidária, concedido pela Constituição Federal de 1988, mas perdido na reforma do Judiciário de 2004. Desde então, apenas os que ingressaram na carreira antes de 1988 têm esse direito.
A classe quer fazer valer a interpretação de que os que ingressaram até 2004 também podem disputar eleições.

O trabalho tem sido realizado em duas frentes. Uma delas, com expectativa de resultados mais imediatos para outubro deste ano, é derrubar uma resolução de 2006 elaborada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que proíbe procuradores e promotores de disputar eleições. Proposta por um procurador da República, ela dividiu os 14 conselheiros. A metade ligada à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), ao Judiciário e ao Congresso é contra. A outra metade, ligada ao Ministério Público, é a favor, à exceção do procurador Mário Bonsaglia, contrário à tese por entender que fere a autonomia profissional do MP. Após sucessivos adiamentos, o assunto voltará a ser analisado no dia 27.

A outra frente é pela aprovação da proposta de emenda constitucional formulada pelo promotor de justiça aposentado e senador Demóstenes Torres (DEM-GO), que permite a atividade político-partidária aos que entraram no MP até 2004. Contudo, o ano eleitoral e a quase nula sensibilidade do Congresso a reivindicações do MP torna essa possibilidade uma pretensão a ser trabalhada na próxima legislatura. Por ora, o que se tenta é a liberação no CNMP de modo que os candidatos consigam pelo menos um argumento a mais para questionarem na Justiça o direito de concorrer.

Para os mais convictos da sua aptidão eleitoral, a saída é pedir exoneração. Foi o que fez o agora ex-procurador da República Pedro Taques, 40 anos. Deixou os 15 anos de atuação no MP para concorrer a uma vaga a senador pelo Mato Grosso. Em seu currículo na carreira pública, acumula casos de repercussão nacional, como a prisão do deputado (então senador) Jader Barbalho (PMDB-PA) por suspeitas de desvio de recursos na Sudam; o tribunal do júri do ex-deputado acreano Hildebrando Pachoal; e a prisão do "comendador" Arcanjo Ribeiro, apontado como o chefe do crime organizado no Centro-Oeste do país.

Taques critica a vedação à atividade político-eleitoral imposta pela reforma de 2004. "Impedir-nos de participar da política só seria possível se vivêssemos em uma democracia ideal, o que não ocorre. Nosso sistema representativo é de classes e categorias sociais. Durante esses 15 anos senti necessidade de mudanças legislativas, mas as leis são feitas por grupos de pressão e o MP tem que ter o dele", afirmou ao Valor.


No Estado, ele se filiou ao PDT e parte para uma acirrada disputa com o ex-governador Blairo Maggi (PPS) e um petista ainda a ser definido entre a senadora Serys Slhessarenko e o deputado Carlos Abicalil. "A sociedade vem perdendo muito por esse sistema. Você não pode impedir que o cidadão tenha esses direitos. Não quero ser um meio cidadão", diz.
Apesar de a exoneração de Taques trazer um cálculo político arriscado - se não for eleito, só regressa à carreira mediante os concorridos concursos públicos -, ela evita longas incursões e indisposições por tribunais de Brasília, além dos inconvenientes das batalhas judiciais contra adversários, vividos, por exemplo, pela prefeita de Santarém (PA), Maria do Carmo Martins Lima (PT), 49 anos.

Promotora de Justiça desde 1990, licenciou-se para disputar a prefeitura pela primeira vez em 1996. Perdeu, mas foi eleita deputada estadual em 1998. Já empossada, perdeu a eleição para a prefeitura novamente em 2000 e para o governo do Estado em 2002. Chegou finalmente ao Executivo de sua cidade em 2004, sendo reeleita em primeiro turno em 2008, com 52,8% dos votos.

Só tomou posse em junho de 2009, pois a candidatura oposicionista sustentou na Justiça que, sendo promotora, ela não poderia ser candidata. O pedido de impugnação foi aceito pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um pouco antes da diplomação da prefeita. Esgotados todos os recursos, veio do Supremo Tribunal Federal (STF) a liberação para a posse de Maria do Carmo, seis meses depois do previsto. "Tornou-se uma das maiores questões judiciais de que se tem notícia no Pará e no âmbito do Ministério Público", afirma seu advogado Walmir Brelaz, que prepara um livro sobre o caso.

O trâmite judicial foi longo: em 10 de agosto de 2008, o juiz de Santarém julgou improcedente a ação da oposição, que recorreu e viu o Tribunal Regional Eleitoral do Pará (TRE-PA) acompanhar a decisão, em setembro de 2008. O caso chegou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 9 de setembro. Em 5 de outubro ela ganhou nas urnas. Antes da diplomação, o TSE acatou as alegações da oposição. Maria do Carmo, então, foi ao Supremo Tribunal Federal, que, em 4 de junho de 2009, julgou procedente seu recurso. Até então, Santarém estava sendo comandada pelo presidente da Câmara Municipal.

No STF, prevaleceu a tese de que falta uma regra de transição para disciplinar os ingressos no MP até 2004 e que se deve resguardar a soberania popular e o direito fundamental à participação política.

A maioria, porém, prefere aguardar uma solução legal para todos. O procurador de Justiça Fernando Fagundes, ex-secretário particular do ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves (PSDB), por exemplo, afirma que a realidade legal é mais forte que seu desejo de concorrer. "Mas sinto essa necessidade de termos integrantes do MP disputando o Legislativo e ter melhor apoio por lá".

Esse apoio é hoje dado por uma bancada de quatro deputados federais -Vieira da Cunha (PDT-RS), Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ), Carlos Sampaio (PSDB-SP) e Dimas Ramalho (PPS-SP) - e um senador, Demóstenes Torres.

Contra eles, a quase totalidade da Casa, revoltada com as ações judiciais e os prejuízos políticos que o MP lhes causa, além de uma forte bancada organizada de policiais civis, militares e federais, os que mais propõem ações contra o Ministério Público.

As associações representativas têm feito um trabalho de aproximação com os parlamentares. "Já há um clima de construção de uma ponte entre MP e Congresso, embora nossa pauta hoje seja mais reativa do que proativa", diz o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Antonio Carlos Bigonha.

Aliado a esse trabalho externo, o MP tem atuado também para dentro da corporação, com os novos e jovens integrantes do MP. "Os arroubos são próprios da juventude. Temos conversado com os procuradores-gerais dos Estados para que os jovens integrantes do MP evitem a prática do açodamento. Por isso estamos passando da repressão aos erros à prevenção", diz o presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), César Mattar Jr.

O alerta aos jovens procuradores e promotores tem sido claro nos cursos preparatórios e nas entidades representativas, a quem o MP vem mostrando que a falta de apoio às suas causas decorre das exorbitâncias .

A própria prefeita de Santarém, que diz ter "a visão dos dois lados" - como política e ao mesmo tempo integrante do MP -, dá o seu testemunho. "O relacionamento é ruim porque os promotores preferem fazer denúncias e depois passar para o Judiciário o papel de dialogar com os prefeitos. Só que aí o estrago já está feito", diz. Ela afirma já ter sido acionada cinco vezes pelo MP e que em todas elas as denúncias foram arquivadas. "A maioria das denúncias do MP no Brasil são infundadas, pois se dá tratamento político a um instrumento que é jurídico, expondo os prefeitos à execração pública", diz ela, favorável à "Lei Maluf": "O que se quer é que o MP responda por denúncias infundadas e por lançar a história do político na sujeira".

No Conselho Nacional do Ministério Público, os indícios de abusos são temas constantes na pauta dos conselheiros. O famoso procurador Luiz Francisco Fernandes de Souza, que deu trabalho aos tucanos durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), foi punido em 2008 com a suspensão de 45 dias por "expressivo exercício de atividade político-partidária". Recorreu ao STF e conseguiu uma liminar que suspendeu a pena. Ainda assim, seu caso é exemplar: desfiliou-se do PT, ingressou no Ministério Público, e escolheu como alvo os tucanos, então no Palácio do Planalto. Com a vitória do petista Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, sumiu.

Tanto entre os políticos como no Ministério Público, Luiz Francisco é apontado como o estereótipo dos perigos da vinculação da atividade partidária com a profissional. A própria vedação que a reforma do Judiciário trouxe é tida como consequência de sua atuação. O PT por não querer um novo "Luiz Francisco" em seu governo. O PSDB, pelo trauma da experiência com o procurador. Não à toa o relator da reforma do Judiciário no Senado foi o senador José Jorge, então no PFL (atual DEM) e vice na chapa de José Serra (PSDB) em 2002. Na Câmara, o presidente da Comissão Especial para avaliar a matéria foi o atual secretário-geral do PT, José Eduardo Martins Cardozo, ao passo que o relator foi o deputado Ibrahim Abi-Ackel (MG), do mesmo PP de Paulo Maluf.





PT corre o risco de ficar sem posto de comando no Orçamento

Caio Junqueira, Valor Econômico, de Brasília, 31/03/2010

As bancadas do PMDB e do PT no Senado disputam a indicação do relator-geral do Orçamento que comandará a destinação dos recursos financeiros a serem aplicados no primeiro ano de mandato do próximo presidente da República.

O PT tenta tirar um nome de sua bancada de onze senadores mas encontra dificuldades por ter candidatos a governador, como Ideli Salvatti (SC), Aloizio Mercadante (SP) e Tião Viana (AC), e outros nomes que o Palácio do Planalto rejeita, como Eduardo Suplicy (SP) e Paulo Paim (RS).

O nome preferido seria Delcídio Amaral (MS), que já foi presidente da comissão. O fato de ser do Mato Grosso do Sul, entretanto, o impede, pois o presidente da Comissão Mista do Orçamento, já indicado pelo PMDB, é o deputado federal Waldemir Moka, seu conterrâneo e adversário na disputa pelo Senado no Estado. Assim, o que tem sido debatido agora é a possibilidade de que o senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) ocupe o cargo.

Considerado fiel ao governo, o Palácio do Planalto tem trabalhado pelo seu nome com a concordância da bancada, já que ele integra o bloco do Senado formado por PT, PCdoB, PR, PSB e PRB.

Ocorre que as dificuldades para chegar ao nome despertou no PMDB o desejo de participar do processo. Mas como Waldemir Moka já irá presidir a comissão, a articulação - capitaneada por Renan Calheiros (AL) - tem sido feita para Gim Argello (PTB-DF). Muito próximo á pré-candidata petista a presidente, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, as chances de ele acabar ocupando o cargo são grandes. Além da proximidade com Dilma, outro fator que o coloca como favorito é a possibilidade de que sua indicação leve o PTB para a aliança governista na campanha petista. Hoje, o PTB se divide entre apoiar o pré-candidato do PSDB, o governador paulista José Serra, e Dilma.

Por esse motivo, o governo considera a possibilidade de não impor restrições ao nome de Argello, embora saiba que possa ser uma "relatoria cara", conforme um interlocutor do Palácio do Planalto. Isso porque ele poderia ceder mais a interesses diversos do governo. Além disso, sendo integrante de um partido dividido entre governistas e oposicionistas, poderia facilitar o acesso aos recursos federais aos adversários dos petistas nos Estados. E, no caso de uma vitória de Serra, conceder aos interesses orçamentários do futuro governo.

Corretor de seguros, foi fundador do extinto PFL (atual DEM) no Distrito Federal, Argello tem uma carreira política meteórica. Foi eleito deputado distrital por Brasília em 1998 e, três anos depois, presidente da Câmara Distrital, sendo reeleito deputado em 2002. Filiou-se ao PTB em 2005, ano em que foi convidado pelo então governador do Distrito Federal Joaquim Roriz para ocupar a Secretaria de Trabalho.

No ano seguinte, entrou como suplente de Roriz na disputa do governador ao Senado. Roriz venceu, mas se viu obrigado a renunciar seis meses depois por denúncias de corrupção, passando, então, a vaga a Argello. Logo ganhou a confiança de Renan e de José Sarney (PMDB-AP) e até chegou a indicar um assessor para a diretoria da Agência Nacional de Transportes Terrestres






Limite de estrangeiros na aviação fica para 2011

Caio Junqueira, Valor Econômico, de Brasília, 23/03/2010

O ano eleitoral e a avançada tramitação de outros projetos do Ministério da Defesa devem impedir que o Congresso aprove, neste ano, a legislação que eleva o limite da participação do capital estrangeiro nas empresas aéreas dos atuais 20% para 49% do capital social.

O projeto foi encaminhado neste mês pelo ministro Nelson Jobim (Defesa), em um pacote que propõe várias mudanças no Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), de 1986. Sua apreciação inicial se dará na Câmara, em uma comissão especial destinada a atualizar o código criada a partir de recomendações da CPI do Apagão Aéreo. Muitas das propostas enviadas pelo ministério foram discutidas na CPI.

Há poucas chances, porém, de aprovação neste ano em que o período legislativo é mais curto por causa das eleições de outubro. O que poderia acelerar a tramitação é o fato de os parlamentares, em sua maioria, concordarem com a proposta do governo, de abertura do capital para até 49%, e já haver um projeto nesse sentido aprovado no Senado que pode ter sua votação final na Câmara.
Duas dificuldades, no entanto, se colocam. O projeto do Senado foi proposto pelo ex-senador Paulo Octávio, que neste ano se desfiliou do DEM e renunciou ao cargo de governador do Distrito Federal por suspeitas de corrupção. Em ano de poucas votações, o Congresso não quer avançar com projetos de lei de iniciativa políticos em má situação entre os eleitores.

Outra questão é que a comissão especial quer apresentar um novo texto para o Código, no qual a alteração na participação acionária é apenas um entre outros tantos pontos que ganhariam força para ser levada à sanção presidencial se aprovados em bloco.

O relator da comissão especial, deputado Rocha Loures (PMDB-PR), afirma que até o fim de maio divulgará seu relatório, que precisa ser votado na comissão, no plenário da Câmara e, depois, seguir para o Senado. "Temos que dar uma resposta rápida à CPI. A consequência prática dela será preparar o marco legal para o setor. Há um senso de responsabilidade que impede que esse assunto fique sem conclusão", afirmou.

O Ministério da Defesa não é tão otimista. "Se olhar a dinâmica do Congresso, ainda mais em ano eleitoral, pode ser que dificulte. E o ministro, nesse primeiro momento, está empenhado em votar a lei complementar de reestruturação dos cargos da Pasta", disse Fernando Soares, do Departamento de Política de Aviação Civil do ministério.

Segundo ele as propostas que já estão no Congresso são boas, mas o Executivo resolveu encampar o limite de 49% como estratégia para que ela fosse aprovada. O próximo passo, depois de conquistados esse índice e analisada sua repercussão no mercado, será elevar a participação para 100%.

"Quando o atual projeto for aprovado, imediatamente haverá a entrada de companhias neste mercado. Até aceitaríamos abrir mais a participação estrangeira, mas preferimos dar um primeiro passo para no futuro avançarmos", afirmou. A expectativa com a aprovação é de que as empresas menores cresçam a partir da injeção de recursos por parte de empresas estrangeiras.