8.10.10

"Campanha deve comparar biografias e se voltar para o futuro", diz Bornhausen
Caio Junqueira, Valor Econômico, De São Paulo, 07/10/2010

A despeito da redução abrupta da bancada do Democratas no Congresso, o presidente de honra do partido, Jorge Bornhausen, 73 anos, chega ao escritório em que despacha em São Paulo, no bairro do Itaim Bibi, na terça-feira, sorridente, acompanhado de dois daqueles que deram sobrevida ao DEM nas eleições de 2010. Seu filho e sucessor político, deputado reeleito Paulo Bornhausen, líder da legenda na Câmara; e o senador Raimundo Colombo, eleito governador de Santa Catarina.

Foi no Estado que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pregou, em 13 de setembro, a necessidade de "extirpar" o Democratas da política. Segundo Lula, o DEM é a "direita raivosa". E comparou: "A mesma que articulou para Getúlio [Vargas] dar um tiro no coração, não queria deixar Jango [João Goulart] governar e boicotou o governo de Juscelino [Kubitschek]". Para o presidente, "essa direita tentou fazer o mesmo comigo em 2005".

O apelo do presidente não foi atendido pelos catarinenses. Paulo Bornhausen foi o terceiro mais votado do Estado. Colombo, eleito em primeiro turno. A candidata do presidente ao governo de Santa Catarina, senadora e ex-líder do governo Ideli Salvatti (PT), ficou em terceiro lugar, tal como o candidato ao Senado, Vignatti.

Depois de um almoço com o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM) - o político "com maior futuro dentro do nosso partido" -, Bornhausen, ao lado dos catarinenses, deu entrevista ao Valor sobre o trabalho do DEM no segundo turno. O partido agora quer a cereja do bolo: ajudar José Serra (PSDB) a derrotar Dilma Rousseff (PT).

Sobre o resultado das urnas de 3 de outubro, avalia: "A realidade é que não fomos extirpados". A seguir os principais trechos da entrevista:

Valor: É a terceira vez que o DEM perde força no Congresso. O partido sai mais fraco dessa eleição?

Jorge Bornhausen: Isso não nos atemoriza. A diminuição das bancadas atingiu vários partidos, não só o Democratas. Atingiu o PMDB, PSDB, o PPS. Tivemos perdas e ganhos nessas eleições. Estávamos sem nenhum governador e ganhamos dois. Por outro lado, diminuímos a bancada na Câmara e no Senado. A realidade é que não fomos extirpados como o presidente queria.

Valor: O ganho de dois governadores é um contrapeso à diminuição da bancada?

Bornhausen: O contrapeso depende muito da atuação da bancada, que vai depender do resultado do segundo turno para presidente. Estamos empenhados na vitória do Serra e temos esperança nessa vitória. Mas se ela não nos sorrir, continuaremos sendo um partido de primeira linha de oposição. Quem ganha é governo e quem perde é oposição.

Valor: Qual a atitude imediata do DEM se voltar a ser governo, no caso de vitória de Serra?

Bornhausen: Se formos governo, como espero, vamos ajudar a limpar essa partidarização do país. A pessoa pode ser política nas indicações dos cargos mas tem que estar habilitada. Não pode estar no cargo porque tem uma estrelinha na lapela. Tem que ter condições éticas. Essa é uma das grandes motivações que temos na eleição do Serra. A maneira ética como ele agiu na prefeitura, no ministério, no governo do Estado. Isso nos leva a acreditar que vai ser dado um basta à corrupção estabelecida de forma vergonhosa desde o mensalão.

Valor: E se o DEM continuar na oposição?

Bornhausen: Se formos oposição não nos calaremos diante das iniquidades que ocorrem no Brasil.

Valor: Mas o DEM não se calou nesses oito anos e mesmo assim o Lula tem 80% de popularidade. A voz do partido está sendo ouvida?

Bornhausen: A popularidade do presidente é muito decorrente da falta de oposição. De oposição organizada, estruturada, que mostre as deficiências do governo. Esse governo aumentou em 340 mil o número de funcionários públicos, abriu 38 embaixadas em desperdício completo de recursos do país, gastou mais de bilhão distribuindo cheques pela África, pela América Central, enquanto nós aqui ainda temos pobreza. Gastou em publicidade o que nunca foi visto. O presidente tomou partido da campanha eleitoral de maneira afrontosa. Utilizava-se do expediente de ir ver determinada obra incompleta como a maioria das obras do governo para poder chegar às 18h e fazer comício. Disputamos a eleição contra a máquina estatal de um presidente da República que não tinha limites e o tribunal apenas aplicou multas. O abuso do poder político tem sido uma coisa inacreditável. Acho que país nenhum do mundo hoje tem uma posição dessa, só nos regimes ditatoriais.

Valor: E onde a oposição falhou?

Bornhausen: Acho que durante todo o governo tínhamos que ser mais atuantes junto ao TSE [Tribunal Superior Eleitoral] , no que se refere ao abuso de poder político. Mais atuantes contra, por exemplo, o excesso de propaganda. A Petrobras fez 50 anos e daí gasta não sei quantos milhões para comemorar. Isso tudo para fazer com que o nome do presidente fosse o mais conhecido e o mais reconhecido.

Valor: O senhor está dizendo que é a propaganda, então, que sustenta a popularidade de Lula?

Bornhausen: A massa de propaganda do governo sufocou o grito da oposição que só existia no Congresso. Com o Congresso alvejado pela ética, não havia repercussão necessária das grandes vozes da oposição que havia ali. De um lado, a propaganda oficial. De outro, a única tribuna para a oposição, o Congresso. Isso nos levou a uma diferença na balança muito grande entre governo e oposição. Foi uma avalanche publicitária. Só agora é que vamos ter igualdade na televisão contra essa campanha excessiva e às vezes até virulenta do presidente da República.

Valor: Por que virulenta?

Bornhausen: De ataques virulentos. Santa Catarina deu a resposta. Quando ele foi visitar obras inacabadas e fazer ataques à família catarinense, a resposta veio. Naquela altura estávamos atrás nas pesquisas e ganhamos no primeiro turno. A oposição tem que reagir. Não pode ser inerte. Tem que estar presente. Quando eles mostram estradas, eu mostro a BR-101 no trecho sul de Santa Catarina. Há sete anos e meio sem ficar pronta. A BR-470 não saiu do papel. A BR-580 não saiu do papel. O aeroporto de Florianópolis é uma vergonha internacional. Não temos que ficar com receio. Temos que enfrentar um governo que gasta muito, gasta mal e onde a ética não existe. Temos que enfrentar isso.

Valor: Foi esse enfrentamento que ocorreu em Santa Catarina?

Bornhausen: Eu estava em Santa Catarina quando ele agrediu a minha família, porque o fez de forma plural. Eu sou de Itajaí, que foi praticamente destruída na enchente e até hoje as obras não ficaram prontas. E ele teve o atrevimento de ir a Itajaí. Ali foi um alerta aos catarinenses que souberam reagir a essa postura que não é digna de um presidente.

Valor: Por que essa postura não foi adotada pela oposição em nível nacional?

Bornhausen: O meu departamento é o meu Estado. Em nível nacional a orientação é do candidato a presidente e daqueles que foram contratados para isso.

Valor: Qual deve ser a estratégia da oposição para este segundo turno?

Bornhausen: No segundo turno o que vale é a comparação entre candidatos, seus princípios e valores. É sobre esse enfoque que a campanha deve ser organizada.

Valor: Como enfrentar a estratégia do governo de fazer a comparação entre os governos Fernando Henrique Cardoso e Lula?

Bornhausen: A campanha não é para trás, é para frente. É o futuro, não o passado. A discussão do passado fica para a história. Eu reputo a FHC, um grande presidente, um homem que renovou, comandou o Real, fez a Lei de Responsabilidade Fiscal, teve a inteligência de fazer o Proer que nos fez resistir à crise. É um grande legado.

Valor: E por que não é utilizado na campanha?

Bornhausen: Porque não se discute o passado. Tem que discutir o futuro. A nova geração quer saber o que vai acontecer. Eu levei meu neto ao Instituto FHC, para ver uma exposição sobre o Plano Real. Ele ia votar pela primeira vez e tinha nascido depois do Real. Então era preciso que ele conhecesse aquilo, o que foi feito. Isso é a história que julga. Mas nessa eleição, é o futuro que importa. Não renegamos o passado.

Valor: O duelo, então, deve ser de biografias?

Bornhausen: De valores. Quem poderá ser melhor na Presidência do Brasil. Que princípios tem. Qual sua trajetória de vida. Isso que o eleitor tem que pesar neste momento.

Valor: O DEM em breve terá alterações em seu comando e já há uma disputa nos bastidores entre Rodrigo Maia e ACM Neto para dominar o partido. Quem deve prevalecer?

Bornhausen: Eu não estou preocupado com a troca de comando. Acho que a liderança exponencial do partido é o prefeito Gilberto Kassab. O partido deve considerar essa liderança como um fator principal, já que no Brasil há muita personificação dos entes políticos, as pessoas são mais importantes do que o partido. E a pessoa que vislumbro com maior futuro político dentro do nosso partido é o prefeito Kassab.

Valor: E os rumores quanto à ida dele para o PMDB?

Bornhausen: Isso é especulação sem nenhum propósito, sem nenhuma consequência. Não existe isso. Kassab é uma liderança muito forte e deve ser o orientador do partido na sequência dessa eleição. É a liderança mais expressiva do partido nessa juventude que o partido tem e no exercício do cargo.

Valor: Ele deve então presidir o partido na troca de comando?

Bornhausen: Não necessariamente presidir o partido, mas liderá-lo.

Valor: A renovação do partido deu certo?

Bornhausen: Raimundo [Colombo] e Rosalba [Ciarlini] são frutos dessa renovação [governadores eleitos em Santa Catarina e Rio Grande do Norte, respectivamente]. A renovação é um processo que se faz com coragem, portanto tem que ser feita de supetão. Depois vai amadurecendo. Agora estamos na fase do amadurecimento.

Valor: O deputado Índio da Costa, vice de José Serra, faz parte dessa renovação?

Bornhausen: Sim. É um jovem de grande futuro e grande valor. Foi uma escolha pessoal do Serra, mas que me alegrou muito porque tem futuro na política.

Valor: Mas os resultados no Rio mostram que ele não ajudou muito a campanha da oposição.

Bornhausen: Vamos procurar melhorar no segundo turno. Se você olhar, a Dilma também não teve maioria absoluta no Rio. Se nós conquistarmos os votos da Marina podemos equilibrar a eleição no Rio.