22.9.10

Do fundo de pensão à feira livre

Por Caio Junqueira, de Vitória, Valor Econômico, 21/09/2010

A candidatura de um postulante à Câmara dos Deputados novato nas urnas nunca antes havia sido tratada com tanto rigor estratégico e demandado tamanha atenção da cúpula de um governo e do partido político que o comanda. Do presidente da República ao ex-chefe da Casa Civil, do ex-poderoso ministro-chefe da Secretaria de Comunicação de Governo até a candidata oficial a presidente, todos opinaram sobre a estreia nas urnas de Guilherme Lacerda, presidente da Fundação dos Economiários Federais (Funcef), o bilionário fundo de pensão dos funcionários da Caixa Econômica Federal.

Deu empate. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-chefe da Secretaria de Comunicação Luiz Gushiken, foram contrários. Para Lula, Lacerda enfrentaria dificuldades pela falta de apoio do governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, do PMDB, e do prefeito de Vitória, João Coser, que, embora petista, integra um grupo interno adversário ao de Lacerda. Gushiken avaliou que o pré-candidato poderia fazer mais pelo governo com os R$ 40 bilhões de orçamento da Funcef do que sendo mais um entre os 513 deputados da Câmara. Em outra frente, José Dirceu, o homem forte do primeiro mandato de Lula, estimulou-o, fazendo coro aos anseios da candidata oficial a presidente, Dilma Rousseff, que alegou haver a necessidade de bons quadros no Legislativo em seu mandato, se vencer. Acabou convencendo Lula, que avalizou o slogan em que até Gushiken deu palpite: "O deputado federal do Lula".

Com o componente político bem desenhado, faltava o fator financeiro. Iniciou, com um auxiliar, os contatos com empresários, que passaram a despejar recursos em sua campanha. Na segunda parcial da prestação de contas divulgada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Lacerda declarou ter arrecadado R$ 964 mil, mais que o dobro do segundo que mais arrecadou no Estado. Um terço desse valor saiu diretamente de pessoas jurídicas, ao passo que os outros dois terços foram repassados pelo partido. "Sempre tive muitos contatos com empresários em decorrência dos cargos que ocupei, mas não quero comprar a eleição. Minha arrecadação é alta porque todos os recursos são contabilizados", afirmou Lacerda ao Valor, durante um intervalo de sua puxada agenda de campanha.

Ele pede voto a quem passa pela sua frente. Sua estratégia é fazer uma campanha "de guerrilha": movimentar-se por todos os lados e atacar em todas as frentes. Apresenta-se: "Meu nome é Guilherme Lacerda, sou candidato a deputado pela primeira vez, aqui está minha trajetória, sou ligado ao Lula e a Dilma. Se você achar que eu mereço, vote em mim, se não, não precisa".

Lacerda também sobe os morros capixabas, frequenta eventos de pequenos comerciantes e recorre ainda a uma antiga estratégia dos tempos da gênese petista: a panfletagem junto ao operariado. Na semana retrasada, foi às 7h até o refeitório da Metalúrgica União, uma das principais fornecedoras da Petrobras e que também tem contrato com a Vale, na qual a Funcef tem participação.

Falou a cerca de 250 funcionários sobre a origem simples no interior de Minas Gerais ("Trabalho desde os 12 anos"), realizações na Funcef ("Elevei o orçamento de R$ 9 para R$ 40 bilhões e participação em mais de 100 empresas"), sua maior necessidade ("Preciso tornar-me conhecido"), promessas ("Me comprometo a prestar contas do meu mandato pelo menos duas vezes por ano") e concluiu: "Meu lado é o dos trabalhadores e excluídos, mas não vejo problemas em me relacionar com empresários e grandes lideranças".

Dentre essas, a mais importante é José Dirceu. A relação é antiga, mas se intensificou depois que o ex-ministro assumiu a presidência do PT, em 1995. Naquele ano, Lacerda integrava a equipe de um dos primeiros governadores petistas do país, Vitor Buaiz, do Espírito Santo, eleito em 1994. O governo enfrentou turbulências com os petistas durante todos os quatro anos de gestão, principalmente com a base sindical, já que Buaiz teve dificuldades para pagá-los em dia. Presidente do partido, Dirceu era presença frequente no Estado para mediar a situação.

Lacerda participou da gestão Buaiz primeiro como diretor de Operações do Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes), depois como secretário de Planejamento. Foi sua segunda participação em governos. Antes, atuara como secretário-adjunto de Indústria e Comércio de Belo Horizonte, na gestão de Patrus Ananias. Quem o recomendou foi Luiz Dulci, atual secretário-geral da Presidência da República, que o conhecera na militância do movimento sindical mineiro ligado à educação, uma vez que Lacerda lecionava em Juiz de Fora.

Após o governo Buaiz, Lacerda voltou a ter relação mais próxima com Dirceu durante a eleição de Lula, em 2002, quando coordenou a campanha do petista no Espírito Santo. Com a vitória, aguardou por semanas um convite para integrar o governo, que não vinha. "Eu queria ir para a Caixa Econômica Federal. Na verdade, queria trabalhar em qualquer cargo no governo, mas ninguém me chamava. Aí o Jorge Mattoso [economista, presidente da Caixa no primeiro mandato de Lula] me convidou para a Funcef". A relação com Mattoso vem desde a campanha petista de 1989, quando atuaram na elaboração do programa econômico petista, ao lado de Aloizio Mercadante, com o qual Lacerda se relacionara no doutorado em economia na Unicamp, no final dos anos 80.

Ao lado de Sérgio Rosa na Previ (fundo dos funcionários do Banco do Brasil) e de Wagner Pinheiro na Petros (fundo dos funcionários da Petrobras), fez dos fundos de pensão das três principais estatais do Brasil grandes investidores no setor de infra-estrutura e instituições poderosas para a política.

A crise do mensalão em 2005, apesar de ter-lhe dado "dor de coluna e crises de choro", não o afastou da Funcef. Foi de lá que assistiu, indignado, a cassação de Dirceu na Câmara dos Deputados. A retribuição ao apoio pode ser medido agora. Dirceu esteve em Vitória no final de agosto para participar de uma plenária em apoio a sua candidatura e de um "jantar-palestra" com empresários. Em um dos eventos, Dirceu lacrimejou quando Lacerda afirmou que "o dia 1º de dezembro de 2005 [data da cassação de Dirceu] deveria ser considerado o Dia Nacional da Injustiça".

Lacerda avalia que o apoio do chamado "núcleo duro" do primeiro mandato de Lula a sua candidatura é superdimensionado. "Não é que estejam investindo em mim. Não tenho essa relação tão privilegiada. Sou apenas um cara disciplinado politicamente, embora não seja um cordeirinho".

Sobre o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, que integrava o núcleo duro nos quatro primeiros anos da era Lula mas rivalizava e disputava poder com o grupo de Dirceu, Lacerda evita falar: "Não quero falar do Palocci porque sei o que o Mattoso passou". Uma referência ao "caso Francenildo", caseiro que teve o sigilo bancário na Caixa quebrado após acusar Palocci de fazer reuniões com lobistas em uma mansão em Brasília. O Supremo Tribunal Federal, onde o processo tramita, recebeu a denúncia contra Mattoso, presidente da Caixa na época do escândalo, e arquivou contra Palocci, então ministro da Fazenda.

As críticas ao ex-ministro, hoje um dos coordenadores da campanha de Dilma, são evitadas no aspecto pessoal, mas diretas na área econômica: "A gente ia na Fazenda [ministério] parecia que estava chegando no governo Fernando Henrique, ou pior até. Foi muito conservador, carregou na taxa de juros". No entanto, ele avalia que Palocci terá um papel relevante no governo Dilma, embora aposte que fora da Economia: "na área política ele será importante no governo".

Com a queda de Dirceu e a posterior ascensão de Dilma à Casa Civil, foi com ela que passou a ter maior contato -também a ser alvo de algumas das famosas cobranças da ex-ministra. Em uma delas, como presidente do Conselho de Administração da Brasil Ferrovias, posteriormente adquirida pela América Latina Logística (ALL) - que o mantém no cargo até hoje - Dilma lhe cobrou maior andamento das obras nos 260 quilômetros do trecho entre Alto Araguaia (MT) e Rondonópolis (MT), ao que Lacerda respondeu: "Ministra, eu levo o cavalo até a poça d'água. Depois, para beber, é com ele". "Então você dá a ele um canudinho para tomar a água", respondeu Dilma. A relação de ambos é bem próxima e, além dela, outros petistas da cúpula nacional têm incentivado Lacerda, como o presidente do PT, José Eduardo Dutra, e o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que gravaram vídeos para a campanha.

É justamente esse apoio da cúpula que tem incomodado o PT capixaba, que critica a candidatura Lacerda por ter sido construída "de cima para baixo", sem o apoio das bases do partido no Espírito Santo e em confronto com candidaturas já tradicionais, em especial a da deputada Iriny Lopes. Deputada federal desde 2002, é considerada a principal adversária de Lacerda pois, estima-se, a coligação costurada por PMDB, PSB e PT deve eleger sete dos dez deputados do Estado: três pemedebistas, três pessebistas e apenas um petista: Lacerda ou Iriny.

Essa perspectiva deflagrou uma rivalidade interna inédita, cujo sinal mais eloquente é o licenciamento do prefeito de Vitória, João Coser (PT), para ajudar na campanha petista. Aliados de Lacerda apontam nessa saída a tentativa de angariar votos para Iriny em detrimento de Lacerda. O prefeito, porém, diz que sai não para fazer campanha nas proporcionais, mas "para levar a campanha de Dilma ao interior".

Reeleito no primeiro turno de 2008 com mais de 65% dos votos, Coser integra a corrente Mensagem ao Partido, maior opositora da Construindo um Novo Brasil (CNB) de Lacerda, à qual a Articulação de Esquerda de Iriny também se opõe. A Mensagem tem como principal expoente o ex-ministro da Justiça Tarso Genro, opositor de Dirceu, que é um nome importante da CNB. "Iriny trabalha há muitos anos conosco. Meu voto nela é declarado, mas sem desmerecer os outros candidatos", afirma o prefeito. Sobre Lacerda, diz que "em 2006 e 2008 construiu poucas relações no PT para quem tinha projeto político de médio prazo".

A oposição interna fez com que Lacerda buscasse apoio em outras legendas. Muitas de suas parcerias são com candidatos a deputado estadual de outros partidos, que negociam apoio político em troca de ajuda financeira. O custo médio é de R$ 30 por voto em potencial. Funcionários ligados à Caixa, por meio da Associação dos Gestores da Caixa (AGCEF), também declararam apoio a ele.

Seus opositores, assustados com o tamanho de sua campanha, afirmam que Lacerda utilizou-se de seu cargo na Funcef para capitalizar sua candidatura. Neste ano, por exemplo, o fundo assinou contrato com a empresa capixaba de alimentos Tangará Foods, pelo qual adquiriu por R$ 136 milhões o parque industrial da empresa.

Lacerda licenciou-se da presidência da Funcef às vésperas da campanha, mediante um pedido do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e da presidente da Caixa, Maria Fernanda Ramos Coelho. "Eles não queriam abrir um processo sucessório na Funcef em meio às eleições nacionais". Diz que sofreu críticas por licenciar-se, mas que preferia o afastamento. "Licenciado não recebo meus vencimentos. Afastado, entraria na 'quarentena'".

Seus adversários também afirmam que seu interesse real é, com os votos que conquistar, credenciar-se para as eleições municipais de Vila Velha em 2008. Maior colégio eleitoral do Espírito Santo, há dois anos participou das prévias petistas para se lançar prefeito, mas perdeu. Outros afirmam que seu alvo é calibrar-se para algum ministério de um eventual governo Dilma, o que já tem sido especulado pela imprensa capixaba. "Não estou fazendo isso com essas perspectivas. Precisava ver como era passar por uma eleição, embora ache que ela pode me credenciar para outros cargos. Mas não é meu objetivo principal".

No Parlamento, afirma querer comprar a briga do veto à fiscalização e controle do TCU, uma luta em que já estão Lula e Dilma, além do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, entre outros. "Não pode o TCU querer mandar mais que Executivo, Legislativo e Judiciário. O TCU virou o quarto poder". Sobre as perspectivas para os fundos, diz que irá trabalhar para incluir a maior parte deles na rota de investimentos do país. "Hoje os fundos têm uns R$ 600 bilhões de recursos, mas muito concentrados em alguns poucos. Tem que ter um jeito desses fundos menores passarem a se interessar por esses investimentos maiores e o caminho inicial para isso é reduzir a taxa de juros", afirma. Para levar à Câmara suas idéias, calcula precisar de 100 mil votos. "Sou uma incógnita. Posso tanto ter uma avalanche de votos como ir muito mal", afirmou.

21.9.10

Destino da Celg sela disputa pelo governo de Goiás

Caio Junqueira, De Goiânia, Valor Econômico, 10/09/2010

O maior eleitor de Goiás não vota. Tem 56 anos, está afundado em dívidas e virou o principal assunto das eleições estaduais. Também não vê, não fala e não anda, embora todos os olhares, vozes e passos dos três principais candidatos ao governo do Estado apontem para ele. Com dívidas de R$ 4,1 bilhões, oito vezes maior que o patrimônio líquido da empresa, a Centrais Elétricas de Goiás (Celg) é a estatal cujo destino pode decidir a sucessão estadual neste ano.

As duas maiores lideranças políticas goianas dos últimos 20 anos estão na disputa: o senador Marconi Perillo (PSDB), governador entre 1999 e 2006 sob o slogan "Tempo Novo", uma alusão à nova era que viria na política regional com a derrota que impôs a Iris Rezende, então o político mais poderoso do Estado e contra quem reedita agora o embate de 1998. Por fora corre o candidato governista Vanderlan Cardoso (PR), um bem-sucedido empresário do setor alimentício eleito prefeito da pequena Senador Canedo, na região metropolitana de Goiânia. Reeleito em 2008, busca se posicionar como a "terceira via" e firmar-se como um candidato "gerente".

Os três estão atentos à intrincada engenharia político-financeira que tem por objetivo drenar alguns bilhões de reais da União para o caixa da Celg e do governo do Estado. Tendo em vista o volume de recursos em negociação para salvá-la - R$ 3,7 bilhões -, os três grupos se envolveram em uma disputa diária em defesa da melhor equação de entrada desse dinheiro nos cofres públicos goianos.

Cardoso torce para que o seu principal cabo eleitoral, o governador Alcides Rodrigues (PP), conclua a negociação antes do primeiro turno, o que abriria espaço para colar na atual gestão o título de salvadora da Celg, e capitalizar votos para o candidato oficial, além de poder atrair o apoio de boa parte dos 246 prefeitos do Estado.

Isso porque a parte da primeira parcela do empréstimo seria destinada a um acerto de contas de ICMS devido pela Celg ao Estado, que repassaria automaticamente aos municípios a cota-parte que a legislação lhe obriga. Em terceiro lugar nas intenções de voto, com 5% segundo o Ibope, os recursos poderiam ajudar a alavancar Cardoso e a conter a debandada de prefeitos aliados que rumam para a candidatura tucana, atualmente a favorita na sucessão.



Receoso com o efeito eleitoral do acordo, Marconi Perillo, com 45% no Ibope, articulou para que seus deputados estaduais alterassem o projeto para que a primeira parcela caísse diretamente nas contas da Celg, evitando, assim, que dela decorram eventuais efeitos eleitorais pró-governo.

Em 24 de agosto, com o apoio do PMDB de Iris Rezende, os oposicionistas conseguiram alterar o projeto na Assembleia Legislativa por 25 votos a 1, de modo que a primeira parcela do empréstimo fosse diretamente para a Celg. O governador, então, tratou de ir mais uma vez a Brasília para articular uma nova saída.

Foi mais um encontro com a cúpula do governo federal, dentre os tantos ocorridos desde sua vitória nas urnas há quatro anos. Tido como um vice-governador discreto de Perillo entre 1999 e 2006, Alcides Rodrigues elegeu-se com o apoio do tucano mas desde o início de seu governo buscou a aproximação com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que revoltou seu antecessor.

Naquela altura, Marconi já era um dos principais inimigos dos petistas do alto escalão do governo federal, devido às suas declarações públicas de que alertara Lula sobre o que seria depois conhecido do público como "escândalo do mensalão". O aviso teria ocorrido dentro de um carro em Rio Verde (GO), no trajeto que ambos fizeram até um evento, em 2004. Ali, Marconi teria informado Lula de que deputados da base governista estavam assediando a deputada Raquel Teixeira (PSDB) para votar com o governo em troca de auxílio financeiro. O escândalo veio à tona em junho de 2005, Marconi tornou público o episódio e Lula o declarou seu inimigo, embora nunca tenha dado sua versão do ocorrido.

Em razão disso, aproximar-se de Rodrigues não era má ideia para Lula, muito menos dar-lhe condições financeiras para caminhar com as próprias pernas e descolar-se de Marconi. Da parte do governador, a aliança com o presidente era importante pela alegada necessidade de ajuste financeiro nas contas do Estado.

Seu grupo alega que recebeu um Estado quebrado de Perillo, que teria promovido uma farra fiscal e diversas irregularidade orçamentárias. Tanto que a principal vitrine divulgada pelo governador é a do equilíbrio das contas públicas, que seria coroada com o acerto final da Celg.

Os tucanos contestam. Afirmam que todas as contas dos oito anos do "Tempo Novo" foram aprovadas pela Assembleia e pelo Tribunal de Contas e que Rodrigues busca razões no antecessor "para justificar a própria incompetência". Para provar isso, Perillo articulou sua maioria na Assembleia para promover duas CPIs, a "da Celg" e a "do endividamento".

A primeira, basicamente, mostrou que todos os governos estaduais desde 1982 têm culpa pela atual situação da estatal, uns mais, outros menos. Os do PMDB, Iris Rezende (1983-1987 e 1991-1995), Henrique Santillo (1987-1991) e Maguito Vilela (1995-1999); os dois de Perillo (1999-2003 e 2003-2007).

A segunda concluiu não ser possível "admitir a existência de um déficit, seja orçamentário, seja financeiro, na passagem do governo de Marconi Perillo para o de Alcides Rodrigues", o que gerou protesto do segundo pela forma como foi conduzida a comissão.

As CPIs acirraram a cisão do governador com Perillo e alimentaram sua aliança com Lula, que abraçou a causa da Celg e a utilizou para atacar o tucano. Em 13 de agosto de 2009, anunciou em discurso em Goiânia um acordo que salvaria a companhia, o que não ocorreu. Em seguida, atacou Perillo, sem citar nomes: "Faço questão de dizer aqui: quem quebrou a Celg? Isso eu faço questão de saber. Quem é que afundou essa empresa?"

E completou, ao referir-se a obras na BR-060, que ficou "sabendo que tem um outro moço que foi a Brasília reivindicar, para dizer que quem tinha reivindicado a obra era ele [Perillo]. Eu quero dizer que a obra não foi reivindicada por ele, porque se ele gostasse tanto dessa obra, ele que foi governador oito anos poderia ter feito".

Sábado, no primeiro comício do ano em terras goianas, Lula voltou a falar da Celg e a atacar Perillo: "Um tal senador que é candidato a governador, vocês sabem o que [ele] fez com a Celg. Até hoje não foi explicado como é que a Celg quebrou. E nós estamos trabalhando há mais de quatro anos para consertar a Celg e resolvemos emprestar dinheiro para que volte a funcionar corretamente e ele colocou os deputados dele para votar contra o acordo que a gente tinha feito para ajudar o Estado de Goiás".

Realizado em Valparaíso de Goiás, o local do ato político que teve também Dilma e seu vice, Michel Temer (PMDB), no palanque, tem valor estratégico para a campanha de Iris Rezende, uma vez que a cidade é um dos polos da região denominada Entorno do Distrito Federal. Com 16% do eleitorado goiano, a região apresenta nas últimas duas décadas crescimento populacional vertiginoso com muitos migrantes, que pouco conhecem Iris Rezende, mas são maciçamente lulistas.

O pemedebista é mais forte em Goiânia, onde renasceu politicamente prefeito em 2004 e foi reeleito em primeiro turno em 2008. Personalista e com discurso recorrente ao "povo" goiano, o candidato afirma que "era dever colocar meu nome à apreciação do povo diante do descalabro que se encontra o Estado" e que "não tem um político do Estado mais comprometido com o povo de Goiás do que eu". Deixou a prefeitura nas mãos do vice petista e, pela primeira vez, uniu o PT em torno de sua candidatura, já que durante toda a história política estiveram em lados opostos.

Com 34% no Ibope, seu alvo principal é Perillo, o favorito, que atua para vencer no primeiro turno e evitar o embate direto contra Lula e Dilma no segundo turno. Se o tucano ganhar no dia 3 de outubro, deve ser o único na história goiana a se eleger contra o presidente da República, o governo do Estado, a Prefeitura de Goiânia e os cinco maiores colégios eleitorais do Estado: Goiânia, Aparecida de Goiânia, Anápolis, Jataí e Catalão.

Sua chapa reedita a composição vitoriosa de 2002, com Demóstenes Torres (DEM) e Lúcia Vânia (PSDB) buscando a reeleição. Seu discurso incorpora as tradicionais bandeiras tucanas, como eficiência na gestão e responsabilidade fiscal. Também pretende adotar os chamados "contratos de gestão", algo já feito pelo PSDB em São Paulo e que se baseia em serviços públicos sendo geridos por organizações da sociedade civil, com base em metas a serem alcançadas.

Sobre a possibilidade de Lula influenciar na disputa, Perillo afirma que eleições estaduais diferem das presidenciais. "Não imagino que o presidente da República, com tanta coisa a fazer, vá perder tempo com adversários como eu", disse, três dias antes do comício de Lula em Valparaíso. Para ele, o ideal é que a Celg busque um investidor privado para, em uma parceria com o Estado, tirá-la do vermelho.






Derrotado em convenção, Caiado opta pela neutralidade
De Goiânia

Texto:-A +A CompartilharImprimirEnviar por e-mail "Caiado não descumpre compromisso. Caiado não trai. Caiado não mente. Caiado não rouba. A minha campanha será solitária. Me coloco em posição neutra na candidatura ao governo, mas se o PSDB afrontar as minhas bases eu saio da neutralidade para o ataque e mostro a força que nós temos no interior do Estado. Nesta hora, com apoio dos meus familiares, me retiro do recinto".

Foi com esses termos que o deputado federal Ronaldo Caiado, presidente do Democratas de Goiás, finalizou, aos brados, seu discurso na convenção do partido, em junho, que homologou a aliança com o PSDB e o apoio ao candidato tucano a governador, Marconi Perillo.

A neutralidade na disputa foi a saída que o deputado encontrou ante a pressão da maioria dos correligionários pela coligação. Queriam evitar a repetição das eleições de 2006, quando, isolado, o partido amargou 3,5% dos votos válidos na candidatura do senador Demóstenes Torres a governador e viu cair sua bancada na Câmara dos Deputados de três para um - o próprio Caiado.

Para este ano, ao contrário da maioria dos 27 Estados do país, Goiás é um dos poucos lugares em que as perspectivas eleitorais para o DEM são muito positivas. Demóstenes é o único senador do partido que tem eleição garantida.

O bom desempenho eleitoral, porém, deve ocorrer sem a anuência de seu presidente regional, que durante todo o primeiro semestre não concordou com a tese da aliança com os tucanos, em razão de antigas desavenças com Perillo.

Juntos quando desbancaram o PMDB em 1998, Caiado alegou, após a vitória naquele ano, que o governador eleito, Perillo, dera pouco espaço a seu partido na composição do secretariado. Seguiram afastados para a eleição municipal de 2000, mas em 2002 estavam juntos na reeleição do tucano, cada qual com seus projetos pessoais em andamento: Perillo queria ser reeleito, o deputado pretendia ser seu sucessor. No entanto, não se esperou muito para que entrassem novamente em conflito. Perillo se incomodou com a filiação ao então PFL de Caiado de uma deputada pemedebista sua opositora. O tucano revidou e levou para sua base aliada mais de 20 prefeitos pefelistas.

Dali em diante a relação piorou e não mais estiveram juntos. Em 2006, Caiado insistiu que seu partido não fizesse alianças e se concentrasse na candidatura a governador de Demóstenes. O resultado foi pífio. O número de deputados caiu e Demóstenes teve 3,5 % dos votos válidos. O único eleito para a Câmara foi o próprio Caiado.

Com base nisso, neste ano a ala interna adversária a Caiado, liderada pelo ex-deputado federal Vilmar Rocha, resolveu se empenhar para fechar a coligação com o PSDB. "Com essa aliança corrigimos o erro de 2006. É nossa aliança natural e com ela devemos ter o mesmo bom desempenho de 2002, quando elegemos três deputados e um senador", afirma Rocha.

Um dos fundadores do antigo PFL e seu primeiro presidente em Goiás, ele teve mais de 73 mil votos nas eleições de 2006, foi o 13º mais votado do Estado (que tem 17 cadeiras na Câmara) mas como seu partido não se coligou, não conseguiu obter o número suficiente de votos necessários para que a legenda tivesse mais um representante na Câmara.

Professor de Direito, ele defende, caso Dilma Rousseff (PT) vença as eleições presidenciais, uma recomposição das forças de oposição. "Não dá para continuar com essa oposição desarticulada. É preciso um reagrupamento partidário, seja cisão ou fusão dos partidos de oposição para formar um núcleo forte de oposição ao lulismo", afirma.

Para ele, a qualidade da gestão Lula é de médio para baixo e a oposição não conseguiu demonstrar isso. Além disso, ela também foi incapaz de mostrar o seu legado positivo. "Tínhamos um legado positivo e não o assumimos. Fomos incompetentes para mostrar ao país o valor desse legado". (CJ)