30.12.08

Kassab aposta em Serra e em investimentos imobiliários para conter crise
Caio Junqueira, De São Paulo, Valor Econômico, 30/12/2008

Depois de cortar R$ 1,9 bilhão do Orçamento e prever não arrecadar os R$ 27,5 bilhões previstos na peça orçamentária, a equipe do prefeito reeleito Gilberto Kassab (DEM) toma posse com o objetivo de em 2009 minimizar os efeitos da crise internacional na cidade que concentra o maior número de empregos e empresas do país para, em caso de sucesso, projetar os efeitos positivos do primeiro ano de mandato para alavancar a candidatura presidencial do governador José Serra (PSDB).

Para isso, conta com o apoio da iniciativa privada e dos recursos financeiros do Palácio do Bandeirantes, grande interessado em que a capital paulista saia ilesa da crise. Prova disso é a presença de Kassab na reunião do secretariado de Serra no dia 19 deste mês, onde o governador detalhou os cerca de R$ 40 bilhões de investimentos que pretende fazer no Estado até 2010, grande parte dele em prol dos paulistanos, como transportes (Rodoanel, Metrô, CPTM) e urbanização de favelas e saneamento, via Sabesp. Os empregos gerados por esses investimentos são o principal antídoto de Kassab para combater a crise e o desemprego.

Também pretende contar com recursos privados, utilizando a revisão do Plano Diretor como estratagema para reaquecer o mercado imobiliário. Aprovado em 2002 na gestão da prefeita Marta Suplicy (PT), a lei previa uma revisão quatro anos depois. Como 2006 era um ano eleitoral, a revisão foi jogada para o ano seguinte, mas travou devido a problemas com a Justiça e com organizações sociais. O motivo foi que a proposta da prefeitura, com mais de mil páginas, veio em conjunto com a proposta de alteração da lei de uso do solo e também foi dado pouco espaço para a realização de audiências públicas. Os imbróglios só terminariam no final de 2007, quando Kassab avaliou que não seria oportuno mexer com leis de zoneamento urbano às vésperas de um processo eleitoral.

Passadas as eleições, o Plano Diretor é tido pela prefeitura como indutor da economia em tempos de crise, já que as alterações que serão propostas ampliarão as possibilidades de áreas para que o setor imobiliário construa. A idéia principal é do adensamento de obras em locais próximos aos metrôs e trilhos da cidade, onde já haja infra estrutura disponível. Diferentemente da linha geral do Plano Diretor petista, que previa o crescimento da cidade nas áreas periféricas e vedou construções em locais saturados.

Isso explica porque, segundo dados da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio, na seqüência da aprovação do Plano Diretor a capital paulista era responsável por 80% dos lançamentos da região metropolitana, índice que caiu atualmente para 50%. Em almoço no Secovi (sindicato do setor imobiliário) neste mês, para o qual levou oito secretários, Kassab reconheceu a fuga de empresas e empreendimentos da cidade, criticou o Plano Diretor de Marta e estabeleceu que fossem feitas reuniões de trabalho entre a prefeitura e empresários do setor. Também se mostrou favorável à retomada das operações urbanas, parcerias entre poder público e privado que permite aos empreendedores construir área adicional à definida pela lei contanto que haja contrapartidas dos investidores.

A reforma do Plano Diretor, porém, será um teste para Kassab em face dos movimentos civis organizados da cidade, como o Defenda SP e o Movimento Nossa São Paulo, que estão apreensivos a mudanças. Afirmam que o plano original sequer chegou a ser implementado, o que seria insuficiente para atestar sua inviabilidade. Ademais, apontam indícios de políticas higienistas, como desobrigar a prefeitura de atender integralmente à demanda por moradia quando houver desapropriação em determinadas áreas. Também temem concessões demasiadas aos empresários.

Tamanha foi a importância dada ao tema que Kassab criou uma secretaria para elaborar e acompanhar o Plano, a Secretaria de Planejamento Urbano. Será comandada por Miguel Bucalem, amigo do prefeito desde os tempos em que cursavam engenharia na Escola Politécnica da USP e que atua na assessoria técnica da Secretaria de Planejamento. Bucalem será responsável ainda pela elaboração de um plano de longo prazo intitulado “SP 2025”, que inclui um planejamento a longo prazo para a cidade em diversas vertentes, como a social (regularização de terrenos), urbanística (reurbanização de áreas ociosas) e ambiental (diminuição da poluição do ar e da água, em especial os rios Tietê e Pinheiros).

Para todas elas a participação dos recursos financeiros do governo Serra é essencial. Entretanto, a crise deve adiar a execução desses planos, principalmente as intervenções viárias. A execução de grandes obras está congelada, dentre as quais destacam-se duas: a ligação da avenida Roberto Marinho (Água Espraiada) à rodovia dos Imigrantes e a construção de túneis que se ligariam continuamente a outros já existentes e fariam a ligação da região da avenida 23 de Maio, passando por baixo do Itaim-Bibi e chegando na outra margem do rio Pinheiros, formando, assim, uma grande via expressa subterrânea.

Daí a importância, para Kassab, da retomada das operações urbanas para captação de recursos privados. Todos os grandes projetos, aliás, partirão de um conceito de que sua execução só será possível com recursos privados. Para isso, conta com a implementação de novos instrumentos jurídicos, como a concessão urbanística. O “SP 2025” também contempla a construção, via PPI, de um grande centro de exposições no bairro de Pirituba (zona norte).

Na composição do governo, essas áreas mais ligadas ao empreendedorismo e à fiscalização foram concedidas ao DEM, como Controle Urbano, responsável pelo Departamento de Controle de Uso de Imóveis (Contru) e pelo Programa de Silêncio Urbano (Psiu), Desenvolvimento Urbano, Infra-Estrutura Urbana e Obras e Habitação, enquanto o apuro da gestão financeira e social do município serão mantidos com pessoas ligadas a tucanos serristas, como Planejamento, Finanças, Saúde, Educação e Governo, com Clóvis Carvalho.

É ele que tem colhido dos secretários as metas de todas as secretarias que serão apresentadas ainda em janeiro, em cumprimento a lei aprovada neste ano que instituiu a obrigatoriedade de apresentação do Plano de Metas. Idealizado pelo Movimento Nossa São Paulo, a lei determina que o eleito, em até 90 dias após a posse, publique no Diário Oficial suas propostas, divididas por setor, por subprefeituras e com prazo para cumprimento, tendo um balanço semestral sobre as realizações. Secretários que encaminharam neste mês a Carvalho as metas de suas Pastas afirmam que já houve redução de metas por conta da crise.

1.12.08

DEM equipara-se ao PSDB na Prefeitura de SP
Caio Junqueira, de São Paulo,Valor Economico,01/12/2008

A formação da equipe do segundo mandato do prefeito eleito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), equiparou forças entre seu partido e o PSDB na estrutura da prefeitura. Em 2005, na posse do tucano José Serra com Kassab na vice, o Democratas ocupou duas Pastas, Educação e Habitação, enquanto Serra colocou onze secretários ligados ao seu partido. As nomeações feitas pelo prefeito até agora equilibraram o jogo. Cada uma das duas legendas detém, por enquanto, sete secretarias.

A mais recente indicação foi a de Orlando de Almeida (DEM), secretário de Habitação, para uma nova secretaria, batizada por ora de Secretaria de Controle Urbano. Será responsável pelo Departamento de Controle de Uso de Imóveis (Contru) e pelo Programa de Silêncio Urbano (Psiu), os dois órgãos fiscalizadores que mais diretamente interferem na vida dos paulistanos, com ações como concessões de alvarás e controle de horários de funcionamento de bares. Com a saída de Almeida da Habitação, seu adjunto, Elton Santa Fé, deve assumir, mantendo a Pasta com o DEM.

Trata-se de mais uma movimentação em que Kassab, habilmente, aumenta o poder de seu partido sem afetar seu principal aliado. Isso já havia ocorrido em duas situações antes das eleições. Em março, quando criou a Secretaria Especial de Desburocratização e nomeou para ocupá-la Rodrigo Garcia (DEM) , seu amigo e ex-presidente da Assembléia Legislativa paulista. Nesse caso, o prefeito ajudou Garcia, que estava desgastado entre os deputados estaduais por liderar um movimento de bastidores que o elegeu presidente da Assembléia em 2005, desbancando o candidato do então governador Geraldo Alckmin, ao qual era aliado.

Também ocorreu em julho de 2007 quando levou aos Transportes Alexandre de Moraes (DEM), seu conhecido desde a juventude quando praticavam esportes no Clube Pinheiros. Frederico Bussinger, ligado a Serra, ocupava a pasta e saiu sob a promessa de criação de uma agência municipal de transportes, o que não ocorreu. Serra, então, criou a Companhia Docas de São Sebastião e colocou Bussinger na sua presidência.

Moraes terá em 2009 cerca de R$ 1,3 bilhão, o terceiro Orçamento da cidade depois de Educação e Saúde, para gastar em uma das áreas mais críticas de São Paulo. Promotor, foi Secretário de Justiça e presidente da Fundação Casa (ex-Febem) durante o governo Geraldo Alckmin (PSDB), trazido pelo vice-governador Cláudio Lembo (DEM), outro figurão do partido que foi nomeado na semana passada para a Secretaria de Negócios Jurídicos. A vinda de Lembo, porém, tem a função maior de trazer para a máquina um dos principais conselheiros políticos do prefeito.

Outro que deve consolidar sua influência no novo governo é o secretário de Infra-Estrutura Urbana, Marcelo Branco. Muito próximo a Kassab, sua ascensão no primeiro mandato foi rápida. Assumiu em janeiro de 2005 a chefia de gabinete da Secretaria de Habitação. Depois, foi diretor da Companhia Metropolitana de Habitação (Cohab), secretário-adjunto de Habitação, atuou em alguns conselhos municipais e, com a posse de Lembo no Bandeirantes, foi nomeado secretário estadual adjunto de Habitação, chegando a presidir a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), autarquia estadual. Depois Kassab o trouxe para ser secretário de Infra-estrutura Urbana e presidir a Empresa Municipal de Urbanização (Emurb).

No comando de relevantes setores, esses três secretários - Moraes (Transportes), Almeida (Controle Urbano) e Branco (infra-Estrutura Urbana) serão o bastião do DEM na gestão Kassab. O número pode aumentar com a provável saída de Andrea Matarazzo da Coordenação de Subprefeituras. Nome de peso no primeiro mandato, perdeu força ao não se envolver na campanha à reeleição do prefeito. Em seu lugar, são cotados Marcos Penido, adjunto de Marcelo Branco, e Ronaldo Camargo, adjunto de Matarazzo e ligado a Walter Feldmann (Esportes).

A sucessão na Coordenação das Subprefeituras é tida como exemplo por integrantes do DEM e tucanos de que a ocupação de espaços dentro do segundo governo Kassab transcende a disputa partidária. Tanto um lado quanto o outro não exige que ela seja ocupada por um correligionário. Isso se dá porque as duas siglas hoje em São Paulo compõem um grupo político uniforme, ou, nas palavras de um alto integrante deste grupo, uma "fusão partidária implícita", cuja meta imediata é fazer com que Serra seja presidente em 2010 e que faça seu sucessor no governo do Estado. O PSDB não abrirá mão da candidatura ao governo do Estado, mas Kassab é visto pelo grupo como opção para disputas futuras depois de seu mandato na Prefeitura de São Paulo.

Para tanto, a costura política realizada foi de que os tucanos cedam mais espaço ao DEM na prefeitura e que os demistas não façam exigências nas composições das chapas de Serra em 2010 - o que abre espaço para uma composição "puro sangue" com o governador de Minas, Aécio Neves- e do sucessor de Serra no Bandeirantes. Na prática, permite ao DEM realizar um laboratório de formação política com seus quadros na prefeitura, e dar autonomia ao PSDB na definição das chapas em 2010.

Dentro do PSDB paulista, o crescimento da participação do DEM é considerado natural conquanto foi o candidato do seu partido que recebeu os 2,1 milhões de votos no primeiro turno e 3,7 milhões no segundo. Tendo, ademais, enfrentado uma candidatura do PSDB, ainda que rachada entre serristas e alckmistas.

Esses, por sua vez, podem ser novamente o grande entrave aos planos de Serra em 2010. Embora não tenham cobrado participação na gestão Kassab, afirmam não anuir com qualquer acordo político entre Serra e Kassab e aguardam o apoio do governador à candidatura Alckmin ao Bandeirantes em 2010. Argumentam que seu poder de fogo é a capacidade de Alckmin de aglutinar setores nacionais do PSDB anti-Serra, conseguindo, desse modo, prejudicar a disputa interna que o governador paulista pode vir a travar com Aécio. O candidato de Serra a sua sucessão, porém, é seu chefe da Casa Civil, Aloisio Nunes Ferreira (PSDB). Serristas dizem que, caso Alckmin queira se candidatar em 2010, deve antes consultar Serra.

Muito embora Kassab esteja fortalecendo a participação do DEM na prefeitura, os tucanos ainda comandam as duas maiores secretarias, Educação (Fernando Scheneider) e Saúde (Januário Montone), e cargos estratégicos ocupados por pessoas diretamente ligadas a Serra, como Planejamento (Manuelito Guimarães), Casa Civil (Clóvis Rossi) e Esportes (Feldmann). Esses três nomes formaram o núcleo duro do primeiro mandato e nele continuarão no segundo, agora ampliado com o DEM.

São essas pessoas que devem ajudar o prefeito a escolher o eventual sucessor de Matarazzo para a Coordenação da Subprefeituras. A Pasta, entretanto, deve perder força a partir de 2009, quando o prefeito pretende reforçar o poder das subprefeituras com mais autonomia e capacidade de gestão. Essa descentralização chegou a ser feita por Marta e também era defendida por Serra, mas quando ele assumiu resolveu centralizar a coordenação de todas as 31 subprefeituras em uma única e poderosa pasta. Agora, a expectativa é retomar o projeto inicial e ampliar o poder a essas unidades locais de definirem suas obras e ações até mesmo em saúde e educação. A Pasta também perderá força com a saída do Programa de Silêncio Urbano (Psiu) de suas atribuições, que passará à Secretaria de Controle Urbano.

Nas outras áreas, o investimento em educação, que no primeiro mandato focou a ampliação da Rede CEU (Centro Educacional Unificado) e a construção e reforma de escolas, deve priorizar agora a qualidades de ensino. Na saúde, além de novas AMAs (Atendimento Médico Ambulatorial), a prioridade será as AMAs Especialidades, para atender pacientes com necessidades específicas em áreas como neurologia e urologia. Um programa que pode crescer de importância nesse segundo mandato é o Clube-Escola, tocado pela Secretaria de Esportes e que visa adequar 450 equipamentos esportivos da cidade em extensões das escolas paulistanas e de seus 2,3 milhões de alunos e suas famílias. Atualmente 100 deles já estão sendo utilizados, com alcance de 300 mil pessoas. Nesses três setores que integrantes da gestão esperam ser vitrines de Kassab, os secretários responsáveis são todos do PSDB.

Aos aliados, foi dada a Secretaria de Trabalho ao vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas e vereador eleito pelo PR, Marcos Cintra, que participou da gestão Paulo Maluf (PP) como secretário de Planejamento, em 1993. A Pasta que irá assumir, a exemplo do que foi feito no governo do Estado por Serra, e entregue a Guilherme Afif Domingos, terá a função de "Trabalho e Desenvolvimento Econômico", traçando planos de desenvolvimento regional via incentivos fiscais para áreas com pouca presença de empresas, como a zona sul e leste. A idéia é que Cintra, que assume a secretaria amanhã, mapeie iniciativas dispersas entre as diferentes secretarias e formalize uma proposta de desenvolvimento regional. Também pretende aumentar relacionamento com o Ministério do Trabalho.

O PR também deve se manter na presidência da Câmara, com Antonio Carlos Rodrigues. Uma compensação à legenda, já que a promessa quando o acordo eleitoral foi firmado era de que o partido ficaria com Transportes e Esportes. A primeira ficou com o DEM, a segunda com o PSDB. A Assistência Social foi dada à vice-prefeita eleita, Alda Marco Antonio (PMDB), que ocupou o mesmo cargo no final da gestão Celso Pitta, em 1999 e 2000. Antes, foi secretária do Menor dos ex-governadores Orestes Quércia (PMDB) e Fleury (PTB).

Seu maior desafio é implementar na cidade os Conselhos Regionais de Assistência Social (Cras), previsto no Plano Nacional de Assistência Social em vigência desde 2005 e que tem sido implementado por outras grandes prefeituras, como Rio e Belo Horizonte. O PV permanece no meio Ambiente e o PPS deve ser mantido em Serviços, além de ganhar a subprefeitura de Cidade Tiradentes, a ser ocupada por Soninha Francine.