2.2.05

Da barganha e da falta de esperança
Caio Junqueira


A reforma ministerial que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva promoverá nas próximas semanas em muito revela a promiscuidade política e o jogo sujo com que a política é feita, desde sempre, no país.

Num jogo que se arrasta há meses, Lula tenta acomodar aliados do Congresso –e inimigos históricos do PT , como o malufista PP_, e dar mais espaço aos fisiológicos PMDB e PTB para, assim, garantir a governabilidade no Congresso nos dois últimos anos de seu governo e aprovar reformas importantes, como a política, a sindical e a trabalhista. Pretende ainda, de quebra, assegurar uma ampla coalizão de partidos com o PT nas eleições de 2006.

Porém, para isso, submete-se à bárbara lógica da política tupiniquim e ajuda a manter um círculo vicioso no qual o comandante que nela não entra acaba punido, seja pela incapacidade de aprovar seus projetos no Legislativo ou por futuras rejeições em alianças eleitorais _com as quais se garante maior tempo de exposição na televisão.

A regra é clara. Se o administrador não conceder cargos a indicados políticos, deputados e vereadores, integrantes do partido “rejeitado” vota contra projetos enviados pelo Executivo, ainda que importantes à população. O bem-estar e a relevância aqui pouco importam, já que as regras há muito estão postas. Em contrapartida, o legislador, líder político ou partido que a elas não se sujeitar pode cair no ostracismo, já que, sem um cargo importante, como uma secretaria, ministério ou autarquia, terá menos exposição na mídia.

Afora isso, o tempo que se perde na discussão de qual-cargo-vai-para-qual-indicado demonstra a insensibilidade dos políticos, que, ou imaginam que o país possui índices econômicos e sociais de uma Escandinávia ou assumem a cara de pau e a suposta incapacidade de poder fazer algo para que se alterem as regras. Isso mostra, além de indiferença, distância entre a política e a vida popular brasileira e a comprovação de que a intenção dos políticos neste país é lutar e conservar suas posições, seus nomes e seus status.

Em São Paulo, o prefeito José Serra (PSDB) tentou, no início, não se submeter às maliciosas regras e teimou em negociar com o chamado centrão, grupo de vereadores do PL, PP, PMDB e PTB que se juntaram para negociar cargos de primeiro escalão e participação nas 31 subprefeituras da cidade.

Serra até tentou depois negociar, mas já era tarde. O centrão apoiou o dissidente do PSDB, Roberto Tripoli, e, assim, o partido majoritário na Casa e do prefeito ficou sem a presidência da Câmara, essencial na condução das votações de interesse do Executivo.

Ainda assim, Serra não deve ser considerado o bom mocinho na luta pelos bons costumes políticos. Longe disso. À exemplo de Lula, teve de colocar políticos no seu governo para contemplar aliados de sua eleição, como PFL, PPS, PDT e PV e preterir as indicações técnicas que tanto prometeu no processo eleitoral.

Diriam, “evidente, esses partidos o apoiaram e a fatura chegou”. No entanto, o enxugamento administrativo da Prefeitura de São Paulo e a fusão de secretarias foram promessas feitas pelo tucano durante a campanha, que não puderam ser cumpridas justamente para acomodar esses “parceiros”.

Umas de suas críticas mais freqüentes à então prefeita e candidata à reeleição Marta Suplicy (PT) era de que ela fez apenas nomeações políticas. A prática, como visto, manteve-se. O que mudou foi o sexo, o nome e o partido.

Até mesmo o governador Geraldo Alckmin (PSDB) entrou na dança. A reforma de seu secretariado _que teve início no final do ano passado_ busca acomodar parceiros como PPS e PDT, de forma a assegurar ampla aliança na difícil campanha para o governo do Estado em 2006, já que o partido carece de nomes para a disputa enquanto no rival PT sobram nomes, como Marta, Aloizio Mercadante e João Paulo Cunha.

Alckmin cai também na ciranda da tradicional política brasileira ao fazer a reforma do seu secretariado de olho no relógio. Precisa terminá-la antes de 15 de fevereiro, data das eleições para a presidência da Assembléia Legislativa. Acomodando outros partidos no primeiro escalão paulista, garante os votos para o nome do PSDB ao cargo.

É revoltante ver que o amadurecimento político caminha a lentos passos no país. Nomes como o de Lula, Marta, Serra e Alckmin, que sempre tiveram como bandeiras políticas a luta pela ética repetem o que os velhos barões do PFL, PMDB e PP sempre fizeram: barganha. Se não pudermos esperar deles a limpeza ética, de quem esperaremos?

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