23.6.05

Contra-ataque

Caio Junqueira

A crise política por que passa o país suscitou, como necessário, um movimento de defesa dos envolvidos, organizado em várias frentes. O governo tenta implementar uma agenda positiva com a proposta de arrocho fiscal, deixando claro que deseja aproveitar o excesso de arrecadação para apoiar o esforço fiscal e, com isso, reduzir a necessidade de elevar os impopulares juros para conter a inflação.

Para tanto, como para a medida ser aprovada é necessário o difícil trâmite nas duas casas Legislativas, com a aprovação de 2/3 dos parlamentares em dois turnos, o Planalto ataca com a reforma ministerial para ampliar o espaço do PMDB no governo e evitar problemas na votação, que, por si só, será difícil em meio a tantas CPIs instauradas e em fase de instauração. Evita também que o governo se torne refém da oposição nessas comissões, que, apesar de controladas por pessoas ligadas a ele, enfrentará o forte desejo de tucanos e pefelistas de que tudo seja investigado e cabeças sejam cortadas, ainda mais quando se fala em minar o maior adversário político a pouco mais de um ano das eleições.

O PT, por outro lado, escolhe como estratégia a união dos integrantes do partido, sempre dividido por suas diversas tendências, e o retorno a suas bases por meio do apoio dos movimentos sociais, principalmente da CUT e do MST. Porém, esse apoio parece mais ligado à cúpula dessas entidades, estritamente vinculadas ao alto escalão do governo federal, do que às massas em si.

Isso porque é difícil crer que todos os cinco milhões de filiados da CUT e as centenas de milhares dos sem-terra apóiam incondicionalmente Lula e sua política econômica ortodoxa e continuísta, que acabou por prejudica-los, ou, pelo menos, mantê-los na mesma situação que combina desemprego, baixos salários e desrespeito às leis trabalhistas. Ou seja, há um abismo na situação de vida da militância e da cúpula que, em tese, deveria defender sua classe.

Só um aparte a quem pensa que um regime de metas de inflação e manutenção de superávit funciona. Dá certo sim, só que para quem sempre deu certo. Quando empresários estão muito satisfeitos com o governo dito de esquerda é porque algo está errado e a história, está sim, está certa, vez que mantida..

No entanto, essa defesa dos movimentos sociais (ou pelo menos de suas cúpulas) é compreensível. É evidente que Luiz Marinho e João Pedro Stedile são contrários à política econômica tucana de Palocci, mas mais evidente ainda é que sabem que uma desestabilização e enfraquecimento de Lula para as próximas eleições deixariam as classes menos favorecidas incertas quanto a quem poderia substitui-lo como liderança, uma vez que essa pessoa, ao menos a médio prazo, não existe. Pensam, então, que antes um Lula aliado à direita do que um Fernando Henrique contrário à esquerda. Contraditório, visto que economicamente têm gestões similares. Mas a questão aqui acaba sendo mais de confiança, história e relações pessoais do que a qualquer outro fator. O PT tenta, assim, se fortalecer e exercer um estranho papel de oposição sendo situação. Aplicará nesta crise a experiência dos anos em que bravatava contra qualquer cheiro de inidoneidade. Mas hoje, sendo governo, fica em uma situação no mínimo estranha para o olhar popular. Como ser ambos ao mesmo tempo? E como fazer isso com a classe de quem soube ser oposição e atacar o que hoje no poder estabelece tão bem? Falar em golpismo das elites remonta a um PT-raiz que soa ridículo, se não cômico, além de ser uma fuga aos pontos reais de toda a celeuma.

Tudo bem que sempre foi muito claro que parte da chamada grande mídia, em especial a “Veja”, em defesa do liberalismo-tucanês que abertamente defende não perde qualquer oportunidade para golpear o partido, o presidente e seus integrantes. Mas todas as acusações vêm, antes da imprensa, de um inimigo que até há pouco era amigo. Nada fora criado. Veio dessa gente que o PT escolheu para dormir junto. Agora, precisa saber lidar muito bem com as contradições que seu governo e seu partido caíram, sob pena de experimentar a sua maior derrota política e ser eternamente lembrado como a maior ilusão da história do Brasil.

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