30.6.05

A solução passa por Minas

Caio

Em se tratando de política, a própria biologia em si é dos seus fatores mais importantes. A idéia de que ninguém, nem nada, é para sempre, nos fornece a constante esperança de que precisamos ter para nos certificarmos que mudanças, se não virão de imediato, poderão vir. Na administração pública, as práticas convivem com as idéias, com a diferença de que as idéias não morrem, mas as práticas sim, uma vez que, para sustentá-las, precisa-se de um ator que as concretize. As idéias não. Ficam ali, boas ou más, à espera de alguém para colocá-las em prática. Em suma, a prática pressupõe a idéia, mas a idéia não pressupõe a prática.

Nesta semana, mais uma vez veio à tona a discussão de uma união entre o PT e o PSDB, os dois principais partidos do país que há anos travam uma luta acirrada, mais pelo poder do que por idéias. Não foi a primeira vez que integrantes da assim chamada nova geração tucana, que tem como figura maior o governador mineiro Aécio Neves, sugeriu, ainda que de forma embrionária, uma aliança entre os dois partidos, ao afirmar que seu partido “está de mãos estendidas” a Lula para ajudá-lo a sair da pior crise política brasileira dos últimos anos.

O gesto, de imediato, causou reações. Mas não na jovem guarda de ambos os partidos e sim na velha geração, já com o acúmulo de todas as rusgas entre ambos os partidos. O pomposo Fernando Henrique, do alto de seu pedestal de presunção e orgulho, desde logo tratou de murchar Aécio e suas pretensões mineiras, diria, conciliadoras. Mesmo tratamento teve o ex-ministro-aparelhador-de-Estado José Dirceu ao prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT), quando, no ano passado, mencionou que não havia diferenças entre PT e PSDB senão o projeto de poder.

Aécio e Pimentel tiveram um episódio recente de boas maneiras políticas. Em março deste ano, o governador buscou o apoio do prefeito para a defesa dos seus interesses na reforma tributária, em especial as mudanças no sistema das compensações da isenção de ICMS nas exportações. "O prefeito Fernando Pimentel tem um papel muito importante aí", afirmou.

Hoje, o governo federal se divide quanto ao tema. Basicamente não-petistas, como os ministros Aldo Rebelo (Articulação Política) e Márcio Thomaz Bastos (Justiça) defendem a idéia da aproximação. Assim como Antonio Palocci (Fazenda), para quem divergir seria se auto-atestar possuidor de grande hipocrisia, já que funciona como um Pedro Malan barbado com sotaque caipira. Já a cúpula do partido representada no Planalto, como Olívio Dutra (Cidades), rejeita o pacto. O mesmo para o PSDB. A geração do prefeito de São Paulo, José Serra, do secretário paulista da Casa Civil, Arnaldo Madeira, também a rejeitam. Frise-se que o bonzinho Alckmin o faz mais por interesse político do que pela convicção de que a aproximação não é viável. Mas por que expor isso, se logo posso ser presidente?

O que simboliza os dois jovens mineiros é uma esperança de que a renovação dos dois maiores partidos que hoje se lascam em farpas nem sempre bem fundamentadas possa, em um horizonte não muito longe, tornar a vivência entre ambos algo que não signifique mais disputas envolvendo egos e os melhores cargos, mas governabilidade e defesa dos interesses do país.

PT e PSDB tiveram origens na luta comum pela redemocratização do país. Em 1989, nas primeiras eleições presidenciais da Nova República, o então candidato tucano derrotado no primeiro turno, Mário Covas, subiu ao palanque de Lula no segundo turno para apóia-lo contra o desastre Collor (ícone da elite da época, mas deixa isso pra lá). A partir daí, no que poderia ter sido um movimento conjunto de construção de um projeto de país, transformou-se na ocupação do espaço do jogo eleitoral deixado pelo PMDB, que, aos poucos, foi se esfacelando.

Travam, desde então, disputas de sangue, o que não se justifica, visto que possuem congruências passíveis, senão da divisão do poder, de um apoio recíproco à governabilidade. Poderiam deixar as diferenças conceituais para os eleitores escolherem qual dos dois deve permanecer. Apenas como exemplo, se essa aproximação fosse hoje. O que se defenderia em conjunto seriam as reformas política e tributária, já que não há muitas divergências entre ambos sobre esses assuntos. Assim, para o bem do país, que sejam aprovadas.
E, naquilo em que há diferença substancial, no caso a política externa defendida por ambos (petistas querem ampliar contato com países pobres enquanto tucanos preferem se manter fortalecidos com americanos e europeus), joga-se a decisão para a população, que, nas eleições, ao escolher entre um ou outro, roga a um deles o direito de a executar conforme escolheu a maioria.

O que separa o PT do PSDB não é definitivo. As diferenças entre ambos se mostram em alguns aspectos pontuais, em outros locais, e em um ou outro fator, ideológico. Os mineiros Pimentel e Aécio sabem disso. E com a força da biologia em envelhecer e fazer passar as pessoas que impedem que novas idéias coloquem para trás velhas práticas, não é muito sugerir que um melhor país vai passar pelo caminho que, ainda de maneira tímida, começam a passar por Minas.

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