8.8.06

Novo Velho PFL

Caio

À sucessão daquilo que foi, até o momento, a notícia do ano no que tange ao assunto de “cidades”, a onda de ataques do PCC, teve-se uma bomba não maior, visto que diferente: a entrevista de Cláudio Lembo à Folha de S. Paulo. Com frases feitas como “Eu me assusto com toda a realidade social brasileira”, “Nós temos uma minoria branca muito perversa” e “Nossa burguesia devia é ficar quietinha e pensar muito no que ela fez para este país”, o governador paulista trouxe à tona os tradicionais elementos que a esquerda brasileira utiliza ao comentar e atacar justamente a classe político-social da qual Lembo participa e representa. Lendo a entrevista, e substituindo seu protagonista por Luis Carlos Prestes, Miguel Arraes ou Leonel Brizola, não há impacto. No entanto, partindo de Lembo, choca e enseja reflexões.

Lembo é uma figura folclórica. Vive há cerca de 40 anos na mesma casa, no tradicional bairro do Bexiga, centro de São Paulo. A casa foi crescendo aos poucos, e, na verdade, é um conjunto de pequenas casas que foi adquirindo com o tempo. Sempre foi o que se pode chamar de velho simpático. Como vice-governador, sempre esteve acessível à imprensa. Não sei se porque vices-governadores, em geral, não fazem nada. Ou se é próprio dos vices não ter nada a fazer mesmo, sobrando-lhe tempo para conversar com jornalistas, entre outros afazeres desnecessários. Mas o fato é que nunca teve aquele perfil peculiar aos políticos, de se considerarem “gente muito importante”. E essa característica reforça a autoridade que teve para dizer aquilo que bem entendeu.

Mais do que isso, porém, revelou sinais desse PFL, partido dito fisiológico, mas que busca renovar sua imagem à população, sem, claro, deixar de lado a fisiologia. E o processo de escolha do vice do candidato tucano a presidente, Geraldo Alckmin, retrata isso. Com a opção pelo senador José Jorge (PE), a legenda focou sua prévia na disputa interna entre o senador Antonio Carlos Magalhães ( apoiador de José Agripino Maia) e o senador Jorge Bornhausen (apoiador de José Jorge). Em vez dos pefelistas escolherem Agripino como vice, visto que era o preferido de Alckmin e tem um perfil mais agressivo ao governo Lula, podendo fazer as vezes do boxeador da chapa, já que o tucano não tem a fibra agressiva. Assim, não houve uma conciliação interna que beneficiasse a aliança escolhida para a campanha presidencial deste ano. Ao contrário, ocorreu uma disputa interna em detrimento da disputa externa contra Lula. A explicação pode ser desde a cultura política nacional que tende a favorecer esse tipo de comportamento até um eventual temor de que a candidatura Alckmin não emplacará mesmo. Algo como “nosso fisiologismo é mais importante do que o deles” (dos tucanos).

Mas a novidade não está aí. Como dito, a luta pelo poder é inerte aos partidos e a suas composições e segmentos internos. E o PFL tem longa carreira nisso, desde quando servia aos militares com a Arena. O que trás nova roupagem à legenda —e o resultado das prévias é uma derivada disso— é essa tentativa de se travestir com uma modelagem urbana. Um novo PFL, pois.

Explica-se. Com a consolidação da democracia, tenta-se desfazer o viés autoritário-direitista-coronelista que o partido encorpa e trazer uma característica urbana à sigla. Afinal, o país se tornou urbano. E são politicamente desastrosas associações com a imagem de Casa Grande & Senzala. Ainda mais ao lembrarmos que o Nordeste está tomado pela onda Lula. A moda é o Centro-Sul industrial-urbano do país. Ali estão os votos a serem captados.

Nessa linha, lideradas por Bornhausen, as novas lideranças do partido passam a ocupar mais espaço que os antigos coronéis nordestinos. Entram em campo o prefeito do Rio, César Maia, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, o presidente da Assembléia paulista, Rodrigo Garcia. Saem os líderes regionais nordestinos, como ACM e Agripino.
Evidente que afirmar que uma turma dessas saiu de campo pode até ser uma expressão forte, mas o que se tem passado no PFL é uma tentativa de se firmar como um partido mais ligado às cidades que ao campo. Melhor dizendo, mais ligados à cultura urbana que à rural.

E aqui entra, nesse raciocínio, um aspecto das declarações de Lembo. Afora o fato de que se viu isolado pelos aliados (sic) tucanos em meio ao clima de Independence Day que São Paulo viveu, afora o fato de ser uma personagem pitoresca desamarrado de submissão à cúpula partidária (e, quem sabe, a quem quer que seja), Lembo registrou um sentimento preponderante na periferia das grandes e médias cidades (e quem nunca por estas bandas andou que verifique): 1. Há uma divisão socio-econômica no país. 2. A casta superior, minoritária, desconhece a casta inferior, majoritária. 3. A casta superior só se preocupa com problemas que afetam a casta inferior quando esses problemas chegam à casta superior. Trocando em miúdos, quando as consequências da ausência do Estado (hospitais, escolas, segurança) ajudam a causar a violência, e essa violência chega aos Jardins, o problema da violência é de todo o país. Todavia, quando as consequências da falta da presença do Estado se restringem a Parelheiros, que por lá fique. E para quem está isolado no meio do furacão quando a bolha explode —caso de Lembo— as papas na língua somem. E o PFL segue sua reconstrução, mantendo os elementos que o fizeram estar sempre no poder, mas na tentativa de compreender o fenômeno urbano-social. Sob pena de ser atropelado pelos votos.

Hello

De Arthur Virgílio, minimizando a pesquisa CNT/Sensus que dá a vitória a Lula no primeiro turno. “O presidente está estagnado nos 40%. Daí ele não passa.” Como assim? Oras, a “estagnação” em 40% é suficiente para ganhar uma eleição. Se não tem o que falar, feche a boca.

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