18.11.05

Brasília (não é) para principiantes

Caio

Tarde de sol forte, 11h40. Chego ao aeroporto Juscelino Kubischek com algumas missões profissionais. A primeira dela é tentar convencer as duas mulheres da Unidas de que posso sim retirar o carro que o jornal alugou para mim, ainda que não tenha em mãos minha carteira de motorista, que já renovou em Bebedouro, mas não foi retirada, dado o fato de eu não mais aí morar. Tento usar, sem êxito, o documento que a despachante me deu. Preciso, então, ligar para uma amiga, esperar dar o seu horário de almoço, pagar um táxi para ela até o aeroporto e pronto. Tenho um Celta prata 2002 1.0 para rodar rumo ao norte de Goiás, onde o jornal me enviou para produzir uma matéria sobre as cidades mais tucanas do país. Antes disso, minha amiga me leva para um breve passeio pelo plano piloto. Ela dirigindo, claro.
A cidade, de fato, é muito bonita. Tudo planejado, tudo setorizado, tudo compartilhado. A Esplanada dos Ministérios é sensacional. Ampla, arborizada. Os palácios e seus traços, acompanhados dos espelhos d´água embelezam ainda mais. À exceção da catedral, que é cafona demais. Há o setor hoteleiro, onde (dã) se concentram os hotéis. Há o setor de mansões, setor dos tribunais, grandes vias que se entrecruzam, eixão, super quadras, postos de gasolina a cada n metros, tudo muito organizado. Organizado até demais. Mas para eles, não para nós, neófitos do Distrito Federal.

Esse limiar entre o belo e o não-belo é rapidamente quebrado com minha transformação de passageiro em motorista. No volante, e sozinho, a cidade é o terror. Após deixar minha amiga em seu trabalho, parto rumo à BR-040. Mas a sensação é de que parto mesmo para o desespero, a raiva, o incômodo da dificuldade de se transitar por aqui. “Como pego o Eixão Norte?”. “Contorna o prédio dos Correios, pega a primeira avenida, vira á esquerda, abaixa e passa pelas tesourinhas (ã?) e segue à direita”. Tento fazer tudo isso, mas não dá em nada. Parto para a segunda tentativa. “Como pego o Eixão Norte?”. “Retorna pelo eixo central (ã?), pega o primeirão balão, mas não entra nele (como?), faz uma curva quase reta (que?), volta, e vira à direita”. Novamente tento fazer tudo isso, mas novamente, nada. Pergunto então a um taxista. “Como pego o Eixão Norte?” “Volta por ali, pega a segunda a direita, vai reto, e antes do viaduto virá a direita ejá ta nele”. Faço isso. Mas antes, no semáforo, confirmo com um casal. Ia fazer o caminho errado (há duas saídas à direita no viaduto), mas ok, desta vez acerto.

A primeira impressão que ficou das explicações é que é facílimo andar aqui, mas para quem sabe. Como em qualquer lugar, diriam, mas aqui é em excesso. As explicações são dadas sempre precedidas de um “é fácil” ou “tá tranqüilo” que me irritam, dado que não me julgo tão estúpido a ponto de não conseguir me locomover com certa independência em qualquer local. Poxa, vivo em São Paulo, já rodei até na Polônia sozinho, e não consigo rodar na capital do país?
Pois bem, sigo a viagem. Percorro 250 km até Simolândia (GO), onde durmo em um hotel de beira de estrada, depois, claro, de duas paradas na rodovia para tomar água de côco, que é vendida a R$ 1. Às 7h do dia seguinte, levanto e rasgo ainda mais o cerrado até Sítio D`Abadia (GO), meu destino final, próximo à divisa entre Goiás, Bahia e Minas Gerais. Passo o dia na cidadela apurando, vou até Alvorada do Norte (GO), analiso autos de processo de cassação de registro de candidatura, bato papo com a juíza, com a promotora e pronto. Sigo de volta para Brasília, onde, três horas depois minha saga (e meu terror) recomeçam. Cansado e melado de suor, preciso urgentemente de um hotel. Preciso de água, banho, sabonete, jantar, assistir ao Jornal nacional e cama. Mas quem disse que é fácil conseguir tudo isso numa quarta-feira à noite em Brasília.

Primeiro, a dificuldade é chegar ao já malfadado setor hoteleiro. Após três perguntadas, chego lá. Agora a missão é outra: achar vaga em hotel. Tudo bem que procurar isso às 19h no meio da semana não é tão aconselhável, mas cazzo, até em Simolândia eu achei um hotel fácil, não é possível não encontrar isso aqui. O diabo é que como os hotéis estão concentrados, você estaciona o carro no estacionamento comum e sai em busca de quarto. Queria um três estrelas. Na real, até um dois estrelas servia, desde que com ar-condicionado, uma vez que o calor aqui é alto e a umidade baixa, o que dá aquela sensação de sufoco constante. Hotel Gran Bittar, tem ar mas não tem vaga. Hotel El Pilar, não tem ar nem vaga. Hotel Mirage, com ar, mas o casal que pegou o que seria meu quarto preenchia a ficha no balcão. Hotel Bittar, muito caro. Desisto dessa quadra, sigo para o setor hoteleiro sul (sim, há um setor hoteleiro norte e um sul, mas não há um leste e um oeste, o que poderia até aumentar a oferta e diminuir a minha procura). No setor sul, após duas tentativas, acho um hotel antigão, com decoração retrô, um ar-condicionado barulhento e funcionários com ar blasé. Desmaio.

No dia seguinte, outra missão. Durmo bastante, acordo tarde e vou ao Congresso. Tenho uma entrevista agendada às 15h, mas chego antes para conhecer a Câmara e o Senado. De terno, a andança começa. “Onde fica o comitê de imprensa?”. “Siga no saguão, sobe a escada, vai até o fim, faz um L (ã?) que é lá.” Só que não é lá. Ou eu errei mesmo. Afinal, o que é “fazer um L”? Uma boa pernada depois e chego no comitê. Pego minha credencial e parto para um breve turismo. Mas o Congresso parece um labirinto, com corredores, escadas, elevadores, salas, gabinetes, restaurantes, plenárias. E ninguém aqui te dá um mapa (tudo bem, mapa não, seria meio ridículo eu com um mapa da Câmara, na Câmara, na frente dos outros colegas jornalistas). Após longas caminhadas, vou para o Senado para minha entrevista. Só que preciso de outra credencial. “Onde fica o comitê de imprensa (do Senado)?”. 22o andar. Ufa, desta vez foi mais fácil. Mais fácil? Entrevista cancelada. “O quê?”. “Hoje o dia está corrido, Palocci pode cair, tem depoimento na CPI dos Bingos e o avião do senador é às 16h”, diz o assessor. Ok. Mas não quero perder o dia. Ligo para a sucursal, explico o ocorrido e me ponho à disposição para ajudar em eventuais pautas do dia. Eis que ganho duas, acompanhadas de uma boa dose de desespero (meu, evidentemente). Era o que faltava um début em Brasília com uma atuação queima-filme com a chefia daqui. No decorrer do dia, as coisas acabaram andando bem. Uma pauta caiu (sobre lei de microcrédito) e a outra deu trabalho, mas foi ok (sobre retirada de assinaturas do requerimento que prorroga a CPI dos Correios).

Tudo terminado, pego o telefone da TAM para antecipar meu retorno a São Paulo de sábado para sexta. Aqui, fica a certeza de que nessa cidade ou se vive ou não se visita. Não é para principiantes.

2 comentários:

Anônimo disse...

Não acredito que vc ainda não tinha ido a Brasília! Realmente não é para principiantes. Passei mal (pela baixa umidade) da última vez que fui!

Anônimo disse...

Aí Cajú, mó trampo hein velho?
Muito boa prosa. Parabéns!!!
Depois te conto qual a minha versão para as "3 palavras"...
Abs,
Oswaldo