18.11.05

Na cidade campeã, PSDB nasceu de briga pelo poder local

(Publicada no Valor Econômico)

Caio

“Foi aquela correria para lá e para cá. Fizemos mutirão, o pessoal procurava a gente, a gente ia na casas, e fomos filiando.” Assim o tucano Jones Roberto, secretário de Saúde de Sítio d’Abadia (GO), relata o episódio que fez desta pequena cidade próxima à divisa entre Goiás, Minas Gerais e Bahia a localidade do Brasil com maior número de tucanos em proporção ao eleitorado. Lá, um em cada cinco eleitores é filiado ao PSDB, em decorrência de uma disputa local pelo comando do partido do então recém-eleito governador Marconi Perillo.

A primeira eleição do atual governador goiano, em 1998, foi o que impulsionou a disputa. No ano seguinte a sua vitória, um dos dois grupos políticos da cidade, ligado ao PPB (atual PP), vislumbrou na fundação do partido de Marconi na cidade o melhor meio para retomar a prefeitura, perdida três anos antes para os rivais do PMDB. Percebendo a manobra, os pemedebistas, liderados pelo prefeito, resolveram também entrar na disputa pelo controle do PSDB local. O resultado foi uma guerra. Quem filiasse mais, teria automaticamente mais votos na eleição interna. “Gente do PPB e do PMDB foi filiando para o PSDB”, relata Roberto, à época do grupo pepebista, que acabou derrotado, segundo ele, com auxílio de tucanos de Goiânia. “Nossa turma ia pedir ajuda para os assessores em Goiânia, mas daí eles acabaram vendo que o grupo do prefeito tava com o poder na época e preferiram eles, que já tinham uma infra-estrutura existente. O que o governador fez com a gente foi fogo. Nós demos o partido para ele e ele nos deu o inimigo.”

Essa lógica de que partido bom é o partido do governador não é nova na cidade. Nos anos 90, os prefeitos de Sítio foram do PMDB, partido dos ex-governadores Íris Rezende (1990-1994) e Maguito Vilela (1994-1998). Com a derrota do PMDB para Marconi em 1998, as forças políticas locais buscaram formar o que em breve seria o novo partido forte no Estado, o PSDB. Roberto explica essa avidez por integrar o partido do governador: “Quando você ‘tá fora’, você recebe benefícios. Por exemplo, o governo manda 100 cheques-reforma para a cidade. Quando você é ‘do lado deles’ tem chance de receber o triplo disso. Tem cidadão que é oposição que não consegue nada.” E relata ainda como o PSDB exerce sua hegemonia local: “PFL, PL, PPS e PTB. Isso é tudo controlado pelo PSDB. Se a gente fizer uma coligaçãozinha PFL e PSDB, ganhamos a eleição, mas ficamos com dois, três vereadores. Se juntar com todo mundo, a gente ganha a eleição e a Câmara dos Vereadores”.

Essas artimanhas, porém, não são suficientes para o êxito eleitoral no Sítio . Condição necessária é obter o apoio de lideranças que detém votos de grandes grupos de eleitores, caso da família Moura, ou “os mineiros”, como são conhecidos. Dentre irmão, tios, primos e sobrinhos, são quase 100 eleitores que sempre votam em bloco, o que, em um colégio eleitoral com pouco mais de 2,3 mil eleitores, faz grande diferença. Provenientes de Unaí (MG), o primeiro a chegar da família foi Joaquim Antero de Moura, de 59 anos, que se instalou no local em 1972 em busca de trabalho na lavoura. O ingresso na política aconteceu em 1986, quando o irmão de Joaquim, Aníbal, elegeu-se vereador e deu início a uma espécie de dinastia no Legislativo da cidade, pela qual sempre um “mineiro” marca presença na Câmara. Aníbal foi o primeiro. Outra sina dos mineiros é o fato de sempre apoiarem quem vence as eleições para prefeito, caso de 2004, quando fecharam com o tucano Kesser Reis.

No entanto, esse apoio pode ter o primeiro revés da história da família e da cidade, com a cassação do mandato do prefeito do PSDB. O Ministério Público do Estado de Goiás move contra ele uma ação de impugnação de mandato pela suposta compra de votos de um casal que vive no Povoado Capão, a 35 km do Sítio . Kesser teria oferecido R$ 1 mil mais um cheque-moradia (programa social do governo do Estado) no valor de R$ 1,5 mil. Nos autos do processo, que tramita em Alvorada do Norte (GO), o procurador eleitoral afirma que “no caso, fica patente que a opção e a liberalidade do voto do casal foram contaminados, exclusivamente, pela exploração de sua pobreza e falta de instrução”. Os advogados do prefeito afirmam que houve apenas uma proposta de trabalho na campanha, na qual não foram mencionados valores.

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