14.6.04

Um círculo viciado

Marcio Pinheiro

O caso Law Kin Chong faz lembrar o clássico dilema presente no debate sobre o tráfico de drogas, que existe porque há demanda pelo produto. O mesmo se aplicaria aos produtos roubados: eles são comercializados porque tem gente que compra.
Mas ao contrário das drogas, as pessoas consomem esses produtos de origem duvidosa (mais baratos) simplesmente porque não podem pagar pelo produto legal (mais caro).
Em comum com o mercado dos entorpecentes, o hábito de comprar produtos ilegais se alastra por todas as classes.
Mas o curioso é que 47% da classe A e 49% da classe B preferem as mercadorias à la “Law Kin Chong”. Justo aqueles que 1- têm dinheiro para pagar pelo produto legal, mas optam pelos de origem duvidosa e 2- geralmente, são os que sofrem na pele as dificuldades de se manter no mercado legal, pagando em dia a brutal carga tributária. Boa parte das classes A e B é dona de empresas (pequenas ou médias), ou de alguma forma estão a ela vinculados (prestam algum serviço ou têm algum parente envolvido, trabalhando nesse negócio) e, portanto, são os mais conscientes sobre essa situação.
Esse é o retrato da elite no Brasil: reclama da carga tributária, mas consome produtos roubados. Produtos, frequentamente, roubados deles próprios, e que muitas vezes são vendidos para engrossar os lucros do tráfico de drogas, em que o número de consumidores é, certamente, mais elevado nas classes mais altas, de maior poder de compra.
Mas certamente o caminho mais fácil seria culpar essa elite. No entanto, lembramos aqui também da (in)competência do Congresso Nacional e da omissão do Executivo sobre questões dessa natureza.
Cabe ao legislativo votar a reforma tributária, que não sai do papel (enquanto o comércio ilegal incha e as pequenas empresas continuam quebrando); o projeto de lei para legalizar as drogas simplesmente não existe e os traficantes, mesmo se condenados, não tem para onde ir (afinal, o crime de tráfico é um crime federal, mas simplesmente não existem presídios federais; a obra do primeiro, em Mato Grosso, foi suspensa).

O TREM DA HISTÓRIA
Além dos projetos parados acima, outra demanda da sociedade que não é desengavetada é o projeto de lei da então deputada federal Marta Suplicy, de 1995, que regulamente a união civil dos homossexuais. Só ontem em São Paulo, a Parada do Orgulho Gay reuniu cerca 1,5 milhão de pessoas (gays, bissexuais, heterossexuais etc.) que gostariam de ver um Parlamento que acompanhasse as causas de seu tempo.

QUEM É O ASSASSINO?
Anthony Garotinho foi eleito governador em 1998 como o homem que iria resolver os problemas de segurança do Rio. O discurso era duro; ele se especializou no assunto. Quem leu “Violência e Criminalidade no Estado do Rio de Janeiro” (editora Hama, 1998, 170 páginas) não tem dúvida de que os autores (entre eles Garotinho) eram muito bem informados sobre o tema, e que o problema seria solucionado.
Teve gente que acreditou, tanto que elegeram a mulher de Garotinho para o governo do Rio, e ela, claro, chamou o marido especialista para comandar a segurança do Estado.
É claro que toda boa análise é feita a posterori, tudo bem. Mas alguns resultados da atuação do ex-governador e atual secretário podem ser comentadas. Mas não vou comentar; melhor é lembrar:
1- Garotinho manteve presos de facções rivais em uma mesma unidade. Resultado na Casa de Custódia de Benfica: 31 mortos;
2- Caso 174. Por ordem do então governador, a polícia não agia enquanto esperava ordens de Garotinho. Resultado: uma professora morta pela polícia “especializada” com um tiro na cabeça e um seqüestrador asfixiado por policiais (eles foram absolvidos);
3- A novela dos bloqueadores de celular: Garotinho era favorável ao uso do celular nas prisões porque o criminoso, ao falar ao telefone, teria a conversa grampeada pela polícia, o que ajudaria nas investigações. Depois, concluiu que a idéia não era tão eficaz assim, quando informado de que esses traficantes punham fogo na cidade e controlavam o tráfico de dentro das celas pelo celular;
4- Caso Staheli: o secretário de segurança apresenta ao vivo e a cores o “assassino” do casal norte-americano na Barra da Tijuca. O acusado desmentiu o depoimento no dia seguinte. Certamente nenhum inimigo político de Garotinho conseguiria dar uma rasteira dessas nele com tamanha eficiência;
5- Sem contar os bandidos que nesse período fugiram pela porta de frente de perídios ou que vendiam/ vendem drogas e fumam maconha nas cadeias (imagens estas mostradas a exaustão pelas TVs no ano passado)
Conclusão: se eu fosse o Gilberto Braga, chamaria correndo o Garotinho para descobrir quem é o assassino de Lineu Vasconcelos.

EU JURO
O Copom não deve aumentar os juros nesta semana. Basta olhar o mercado futuro: a taxa Selic já está alcançando o mínimo aceitável. Leia-se: com um taxa ainda menor de juro (ou bem menor, como deseja o presidente Lula), os investidores evaporam. A avaliação é reiterada pelo ministro Palocci, que no último dia 7 disse que “os juros já cumpriram seu papel na retomada da atividade econômica”, ou seja: não precisam mais cair.

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